As adaptações de Lionel Scaloni na Argentina

Com decisões arriscadas jogo após jogo, Lionel Scaloni levou a Argentina para final da Copa do Mundo a partir de adaptações e escalações diferentes em cada uma das partidas do mata-mata: explicamos em detalhes, as estratégias adotadas pelo treinador contra Austrália, Holanda e Croácia

A Argentina chegou na Copa do Mundo com um modelo de jogo bastante consolidado e como uma das favoritas ao lado de Brasil e França. Entretanto, a lesão de Lo Celso trouxe uma das maiores dores de cabeça para Lionel Scaloni na montagem daquele considerado “time ideal”.

Sem encontrar o substituto até a estreia, apostou por Papu Gómez e a mudança para o 4-2-3-1 na estreia contra a Arábia Saudita. A derrota, somada a atuação abaixo da média em relação ao esperado, trouxe diversas incertezas…

No futebol, esporte com maior possibilidade de variações, imprevisibilidade e pequenos detalhes que decidem o jogo; o treinador da Argentina não teve medo de arriscar. A partir do jogo contra o México, onde realizou seis (!) mudanças, Scaloni começou a moldar a Seleção — sem perder os princípios de seu jogo — de acordo com o adversário. Até chegar a final do Mundial, observamos a Argentina com diversas variações: 4-2-3-1, 4-4-2, 3-5-2, quatro meio-campistas, um volante mais fixo, dois pontas e falso 9.

Como as mudanças do treinador acabaram por ser determinantes no desempenho da equipe ao longo do mata-mata? Vamos explicar em detalhes:

O “surgimento” dos 3 zagueiros contra Austrália

Ao chegar em seu primeiro mata-mata, Lionel Scaloni viu pela frente a Austrália, uma equipe que buscava se defender em bloco médio-baixo e fechava todos os espaços por dentro. A escolha do treinador foi pelo 4-3-3 com Papu Gómez, substituto de Di Maria (lesionado), aberto pelo lado esquerdo e Julian Álvarez aberto pelo lado direito; enquanto Lionel Messi ficava centralizado como um falso 9.

Qual o motivo desta escolha? Scaloni pode ter imagino que, como a Austrália não realizava muitas saídas desde a defesa, poderia descansar Messi e não se preocupar tanto com Aaron Mooy em construção e focar no fechamento dos espaços pelo lado do campo e igualando o criando uma superioridade numérica de 3vs2 com Enzo, De Paul e Mac Allister.

Entretanto, o plano inicial não foi como o esperado e a Austrália utilizou muito bem da superioridade na saída de bola (3v1) e gerava dúvidas no meio-campo argentino para quem ir pressionar e a bola longa foi uma arma importante para os australianos.

Sem uma pressão forte, Austrália tinha tranquilidade em saída de bola e criava superioridade no setor com apenas Lionel Messi;
Dúvidas geradas se o meio-campista faz a cobertura ou sobe pressão, enquanto o jogador tem liberdade para realizar uma bola longa as costas da defesa.

Para voltar a competir, mesmo com o 1-0 no marcador, Lionel Scaloni utilizou o sistema com 3 zagueiros. Logo aos 5′ do segundo tempo, retirou Papu Gómez e trouxe Lisandro López — uma mudança que ao primeiro olhar parece defensiva ao trocar atacante por zagueiro, mas que se tornou ofensiva. A Argentina então utilizou pela primeira o sistema com três zagueiros, testado apenas algumas poucas vezes antes da Copa do Mundo.

O 3-5-2 com Lisandro Martínez e Julian Álvarez e Messi como dupla de ataque

O resultado dessa mudança trouxe uma melhor organização para circulação da posse de bola, mas principalmente: a Argentina passou pressionar melhor a Austrália e parou de sofrer tanto em contra-ataques ou no jogo direto — exceção dos minutos finais quando os australianos fizeram o “abafa” na busca pelo empate.

Um bom exemplo do melhor encaixe na pressão, foi o 2 a 0 marcado por Julian Álvarez. De Paul pressiona o lateral, obriga o passe para trás e todas as outras opções estão cortadas o que acaba gerando um erro de Matt Ryan. Logo após, a equipe de Scaloni manteve o ritmo e observem como os alas encaixam nos laterais rivais e obrigam o chutão.

O encaixe e a subida dos alas para pressionar a Austrália após a mudança para o 3-5-2

Igualando o sistema e anulando Dumfries contra Holanda

Para se classificar às quartas de final da Copa do Mundo, a Holanda apresentou sua melhor versão sob o comando de Van Gaal: utilizar a força dos alas (Dumfries e Blind) com muito jogo por dentro utilizando (Frenkie, Klassen, Gakpo e Memphis). Havia uma expectativa muito grande sobre a forma como jogaria a Argentina e o trabalho dos seus laterais — além da pouca pressão alta que Lionel Messi proporcionaria contra uma saída de 3 zagueiros com alto poder de construção (Timber, Aké e Van Dijk).

Qual foi a solução de Scaloni? A reutilização do 3-5-2, mas com outro intuito em relação a partida contra a Austrália. Desta vez, individualizaria a marcação no meio-campo, deixaria uma sobra no meio-campo e alas bateriam com alas.

Esta mudança tirou toda a fluidez do jogo holandês e, a partir da qualidade individual dos jogadores, a Argentina conseguiu controlar praticamente 90′ do jogo — com exceção dos erros para o empate em 2-2. De qualquer forma, inclusive na prorrogação os espaços foram gerados e a Argentina sempre esteve com a classificação mais próxima do que os rivais.

Claro que nem tudo se referia a parte defensiva, mas a Argentina criou também a partir desse sistema e criando dúvidas defensivas para Dumfris — que tinha problemas no setor.

Uma partida que também teve o brilho individual de Lionel Messi, mas contou com Lionel Scaloni anulando as principais armas ofensivas de Van Gaal. A classificação para a semifinal chegou e a Croácia era a adversária.

Encaixes no meio-campo e Brozovic isolado na Croácia

Ao longo da Copa do Mundo, a equipe de Zlatko Dalic buscava controlar o jogo com a posse — mesmo que sem muita agressividade — e tentar ir impondo seu ritmo (ou diminuindo o dos adversários, como o Brasil). Com um trio de meio-campistas de dar inveja para as outras Seleções, o caminho poderia ser segurar Marcelo Brozovi, Mateo Kovacic e, claro, Luka Modric. O que Lionel Scaloni poderia fazer?

Ainda sem Di Maria em plena forma física, o treinador optou por Leandro Paredes e um 4-4-2 bastante clássico dos meio-campistas. O jogador da Juventus se somou a De Paul, Enzo Fernández e Alexis Mac Allister. Porém, outro jogador teria uma função vital na partida: Julian Álvarez.

Com o atacante do Manchester City encaixando em Marcelo Brozovic, a saída da Croácia começa “quebrada” e sem a opção de Luka Modric, marcado por Enzo Fernández. Aqui, importante ressaltar que Kovacic conseguiu sair duas ou três vezes com conduções, mas seguia sem encontrar os parceiros de meio-campo para se postar no campo de ataque e, sem jogadores tão determinantes nas zonas adiantas, a Croácia não conseguiu criar tantas chances de gol mais claras, apesar de chegar.

A marcação obrigada Brozovic a recuar entre zagueiros e a Argentina se portava no 4-4-2 para tentar fechar espaços do rival

A opção da Argentina aqui, foi defender sem ser tão agressiva e subindo a pressão para gerar espaço nas costas da defesa croata e transições. O gol marcado por Lionel Messi, de pênalti, após o ataque as costas da defesa — algo bem argumentado por Michael Cox, do The Athletic, como ponto chave para a vitória. Depois, com o transcorrer da partida, a Croácia seguia tendo a bola e Argentina, em mais um transição conseguiu fazer o 2-0, também em uma jogada de velocidade, e posteriormente o 3-0 em grande jogada de Lionel Messi.


A final contra França promete. O técnico Lionel Scaloni já fez um trabalho digno de aplausos ao conduzir a Argentina a final da Copa do Mundo e criar o melhor contexto possível para Lionel Messi dentro de campo, sem esquecer dos rivais e se adaptando a eles para ganhar a partir de suas individualidades.

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