Inspiração italiana, negociador agressivo e monitorador de jovens: Thiago Paes revela os bastidores do crescimento do CRB

Executivo de futebol comenta sobre a influência italiana, categorias de base, perfil de atletas, o processo de avaliação do trabalho do técnico e ressalta a importância do retorno do futebol

A vitória incontestável diante do Cruzeiro, no Mineirão, pela terceira fase da Copa do Brasil, foi apenas a ponta do iceberg de um longo trabalho de estruturação que colocou novamente os holofotes sobre o Clube Regatas Brasil. A construção de um dos maiores Centros de Treinamentos do Nordeste e a profissionalização do futebol têm sido aspectos importantes na propulsão do CRB no cenário regional e nacional. E a mente por trás do projeto audacioso é do executivo de futebol, Thiago Paes. Um jovem de 32 anos que reoxigena e lidera um processo de estruturação e mudanças culturais no clube alagoano.

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Apaixonado pela Juventus de Turim, Thiago Paes, sempre teve desejo em saber mais dos bastidores e, encontrou em Luciano Moggi a primeira referência de um gestor de futebol.

“Não só assistia a equipe, mas procurava ouvir e ler as entrevistas do Moggi tratando sobre o interesse em um jogador e as técnicas utilizadas para despistar a imprensa”

Thiago Paes

As migalhas intelectuais concedidas por Moggi foram a grande força motriz da carreira do atual executivo de futebol do CRB. A partir desse contato, buscou se especializar e formou-se em direito desportivo. Em pouco tempo fundou uma equipe de Futebol 7 e começou a se destacar por ter um perfil de negociador agressivo.

“Ao identificar um jogador que sobressaia aos demais no campeonato, já buscava iniciar uma negociação para tentar contratá-lo e fortalecer a minha equipe na próxima temporada”

Thiago Paes

O sucesso na equipe de Fut 7 foi tamanho que o CRB realizou o convite para assumir a gestão das categorias de base. À frente do Galo da Pajuçara, adotou um modelo empresarial ao criar um novo CNPJ e separar as gestões do profissional e categorias de base. Os resultados não demoraram a aparecer. Em um período de dois anos o CRB conquistou títulos no alagoano nas categorias sub-15, sub-17 e sub-20 e, projetou atletas para o cenário nacional como José Ivaldo, que foi campeão da Sul-Americana pelo Athletico Paranaense e, Lucas Fernandes, que jogou no Fluminense e agora está Consadole Sapporo do Japão

CRB Thiago Paes
Thiago Paes na apresentação de Rafael Longuine, meio-campista emprestado pelo Santos. Foto: (Reprodução/CRB)

“Não cabe mais realizar contratações alicerçadas em um surgimento repentino por marcar dois, três gols em um campeonato estadual. Os nossos atletas têm histórico de categorias de base em grandes clubes como Internacional, Cruzeiro, Athletico Paranaense, São Paulo, Flamengo, Fluminense, Vasco…”

Thiago Paes

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Após o sucesso nas categorias de base e uma saída rápida, Thiago Paes retornou com a responsabilidade de gerenciar o futebol profissional do CRB. E por apresentar um histórico com trabalho nas categorias inferiores, iniciou uma mudança de perfil de contratações. Se antes o clube alagoano focava em jogadores “medalhões” para “lotar aeroporto”, com Thiago a balança foi reequilibrada e começou o monitoramento periódico de atletas com formação sedimentada em grandes clubes e que ainda não despontaram.

“Atualmente procuramos mesclar a experiência com atletas jovens que são monitorados através de um banco de dados, ao qual criei ao assistir competições e identificar atletas com potencial de crescimento. Mas que por algum motivo ainda não conseguiram performar no futebol profissional. Alisson Farias, Léo Ceará e Felipe Ferreira foram atletas que trouxemos ano passado e foram grandes destaques na Série B. Seguindo essa filosofia contratamos para 2020: Léo Príncipe, Bruno Consendey, Dudu, Erik Nascimento e Bill todos com histórico de formação”, comentou o executivo.

Você confere outros trechos da entrevista abaixo.

Qual a melhor forma de captar jogadores?Através de peneira? Método observacional?

Eu não acredito que consiga avaliar um jogador em um peneirão. Não crítico quem o faz. Afinal, não sou o detentor da verdade. No entanto, enxergo que é necessário uma observação em um universo de tempo maior. Por isso, o acompanhamento através de um observador técnico nos dá a possibilidade de ser mais assertivo. No CRB ainda não temos essa condição de ter um quadro robusto de scouts. Com isso, os treinadores das categorias de base realizam essa dupla função à medida que vão acontecendo campeonatos locais.

“Ainda estamos nos estruturando nas categorias de base. Precisamos melhorar a infraestrutura para poder captar jogadores de forma mais acentuada.”

Thiago Paes

Como funciona o processo de captação de jogadores nas categorias de base?

A nossa captação é realizada de duas formas: a partir do acompanhamento em loco de competições locais através da comissão técnica das categorias de base. E ao identificar um jogador destaque, entramos em contato com o agente ou família, e o convidamos para um período de uma semana de avaliação no CRB com todas as despesas pagas. E a outra forma é por indicações de alguns dos profissionais ligados à base do clube recebe. E dentro desse formato buscamos informações com gestores e técnicos para também trazê-lo para uma semana de teste aqui no clube.

O CRB possui uma filosofia de jogo institucional nas categorias de base? Ou é uma atribuição do técnico?

Sim. Nas três categorias as equipes atuam no 4-3-3 com extremos de velocidade, meio-campistas com capacidade e qualidade para atacar e defender e um centroavante com feeling para fazer gol. Tudo isso, respeitando uma filosofia de jogo propositivo.

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Thiago Paes conversa com o técnico Marcelo Cabo antes do treino no CT Ninho do Galo. (Foto: Reprodução/CRB)

Como é a sua atuação profissional em relação ao trabalho do treinador?

Eu procuro conversar com o técnico a respeito das estratégias adotadas em uma partida. Ou até mesmo a escolha por um atleta que no nosso prisma não está rendendo o esperado. Pois, isso facilita a compreensão do trabalho e me ajuda no momento no qual for cobrado pela imprensa e o presidente.

Como acompanha e avalia o trabalho de um técnico?

É inegável que o resultado é o maior balizador do trabalho do técnico e o meu como executivo de futebol. Obviamente que não dá para manter um técnico que não transforma desempenho em resultado. Mas a decisão de demiti-lo não é intempestiva. Analisa-se o dia-a-dia, como o trabalho é fundamentado e os porquês do resultado não acontecer. E se o parecer é positivo, procuro apoiá-lo e dividir a responsabilidade com o objetivo de reverter o cenário. O Chamusca por exemplo, passou por um momento de crise. Foram seis jogos em casa e nenhuma vitória. E mesmo assim mantivemos no cargo. Pois a avaliação era que o trabalho estava sendo bem feito. Mas se mesmo com tudo isso, o trabalho não evolui. Chega-se a um ponto que fica insustentável e se faz necessária a troca de comando técnico

Qual o perfil dos atletas monitorados pelo CRB?

Dificilmente trazemos jogadores que não possuem histórico de categorias de base. Os nossos atletas tem passagem por categorias de base em grande clubes como Internacional, Cruzeiro, Athletico Paranaense, São Paulo, Flamengo, Fluminense, Vasco. Afinal, o processo de formação que é composto por conteúdos técnico, tático, físico e mental, tornam o jogador apto para atuar no alto rendimento. Por isso, prezo muito por trazer jogadores que tivessem formação em grandes clubes. Diminuindo, assim, as chances de erro.

Como funciona o processo de contratação de jogadores na equipe profissional?

No CRB nós formamos um colegiado com o diretor de futebol, Rodrigo Freire, eu, o executivo de futebol, o técnico e o presidente. E a partir de um perfil traçado no início da temporada, analisamos os aspectos técnicos, táticos, custo-benefício, números de jogos, desempenho, histórico de lesões, comportamento e extra-campo. Após a discussão, tomamos a decisão em conjunto.

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Artilheiro da Copa do Brasil, Léo Gamalho marcou duas vezes e CRB derrotou o Cruzeiro no Mineirão. (Foto: Reprodução/CRB)

Qual a importância da vitória contra o Cruzeiro?

Nós tínhamos um início de temporada muito promissor. O elenco deu liga e nós estamos vivos nas três competições que estamos participando. A vitória diante do Cruzeiro simboliza bem esse momento que atravessamos. E contávamos com a renda do jogo. Pois já tínhamos dois terço dos ingressos vendidos para o jogo da volta. A expectativa era de casa cheia. Além, claro, da possibilidade real de classificação e de garantir uma cota substancial. Mas aí veio a pandemia e modificou tudo.

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O CRB já tem um protocolo estruturado para o retorno do futebol?

O CRB está pronto para receber os atletas, seguindo todos os protocolos exigidos pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e Federação Alagoana de Futebol (FAF) que está respaldado pelo Ministério da Saúde. Portanto, o clube está apto a realizar a testagem de COVID-19, anamnese diária, a limitação de pessoas que vão frequentar o CT e dividir as atividades nos quatro campos para evitar aglomeração. Em termo de estrutura nós estamos prontos. Mas obviamente dependemos da liberação do Governo do Estado.

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CRB lançou máscaras de proteção personalizadas no combate ao Covid-19. (Foto: Reprodução/CRB)

Qual a sua visão sobre o retorno do futebol no Brasil?

Não sou extremista, acredito que deva ter um meio-termo de aos poucos encontrar maneiras dentro de uma razoabilidade ir flexibilizando. Ao menos dos estaduais. Pois ainda está muito heterogêneo a transmissibilidade do COVID-19 nos estados. Mas se não retornar as atividades, não retornam as competições e obviamente não terá receita. Pois os patrocinadores não vão pagar, a Globo não repassará dinheiro para CBF e consequentemente não enviará para os clubes. Gerando um problema de fluxo difícil de ser administrado.

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