Como funciona o sistema de marcação do Torino de Ivan Juric

Um sistema que une marcação ao homem com a por pressão é um dos trunfos da terceira melhor defesa da liga

Uma das grandes questões para um treinador que se preocupe com a defesa é saber qual sistema utilizar entre o sistema de marcação homem a homem, ou o sistema de marcação por zona. Porém, para o croata Ivan Juric, treinador do Torino, se pode optar por um sistema misto.

O Torino de Juric usa a pressão e a defesa mais adiantada como suas principais ferramentas para se defender. Os números demonstram como o Toro tem um dos melhores sistemas do campeonato, sendo a terceira melhor defesa até aqui, com 19 gols sofridos, atrás apenas de Napoli e Inter. 

As táticas, os princípios, são como os de Gasperini: o 3–4–3, a marcação-pressão homem a homem em todo o campo, o uso ofensivo dos “braços” da defesa de três homens. Nas equipes de Juric, porém, há uma certa agressividade, vista em fatos como suas faltas táticas. 

Isso poderia ser visto como um dos problemas do sistema de Juric, já que com as marcações homem a homem, um dos seus principais problemas é que basta ganhar de um jogador para criar uma cascata de desequilíbrios em todo o sistema.

Mas, por outro lado, o Torino usa como uma arma a seu favor o fato de ser a equipe que mais comete faltas no campeonato, com cerca de 17.8 faltas/jogo, isso se deve ao fato de que a defesa alta também possibilita o uso sistemático que os granata fazem, usam e abusam da falta tática.

Se o objetivo é arriscar o mínimo possível, a falta se torna o último recurso para não explodir o sistema de marcação homem a homem. E se você for driblado por um adversário, certamente é melhor cometer uma falta no campo do adversário ou no meio-campo do que próximo a sua própria área. 

Além disso, essa é uma forma comum de igualar os confrontos, muitas vezes desiguais, para o lado mais físico, em, talvez, uma tentativa de controle de hierarquias primitivas entre corpos no campo, como dito por Emanuele Atturo, em L’Ultimo Uomo. Suas equipes sempre querem deixar claro quem está no comando fisicamente.

Em suma, o Toro é uma das equipes que pressiona mais alto e de forma mais agressiva do que a Serie A. A aplicação da pressão em todo o campo, neste sentido, serve ao time de Juric para fazer com que os adversários fiquem de costas para a equipe granata, direcionando-os para uma das linhas laterais. 

Na imagem abaixo, por exemplo, o Torino leva a pressão homem a homem até os limites da área adversária, obrigando Deulofeu a receber com Lukic atrás dele e apenas a linha lateral à sua frente. O jogador de lado catalão da Udinese acabará por perder a bola.

O sistema de marcação-pressão do Torino de Juric. (Foto: L’Ultimo Uomo)

Isso acontece porque, desta forma, quem recebe nas entrelinhas não só terá sempre um homem atrás, mas também todos os seus companheiros marcados com exceção do goleiro, que se não quiser tentar dribles arriscados ou soluções forçadas muitas vezes continua a ser a única solução disponível para quem tem posse, como nessa imagem, diante da Roma:

El Shaarawy tenta driblar Singo na ponta, mas não consegue e acaba gerando oportunidade ao Toro. (Foto: L’Ultimo Uomo)

O Torino nunca pressiona o goleiro adversário, a menos que aproveite erros adversários, e isso já diz muito sobre o que os granata procuram pressionando tão alto e de forma tão agressiva. Assim, evitando a pressão sobre o goleiro, a equipa de Juric mantém sempre a superioridade ou no máximo a paridade numérica atrás, onde obviamente o goleiro Milinkovic-Savic não poderia subir pra marcar os atacantes. 

Isso porque, por mais contra intuitivo que pareça, o Torino não pressiona tanto para criar perigos para seus adversários, mas para se defender de forma mais eficaz e segura. Claro, houve ocasiões em que a pressão criou perigos para o adversário, mas não é exatamente uma regra. 

Por outro lado, isso não significa que o Torino jogue ao acaso. Não se pode dizer que o jogo de Juric carece de organização e padrões destinados a gerar uma evolução que é apenas aparentemente aleatória. Afinal, se a marcação homem a homem é feita a partir do campo de defesa adversário, em sua transição, ou no meio do campo, a equipe sempre pode alcançar um de seus velocistas com passes mais longos após uma roubada de bola, como Singo, Djidji ou Vojvoda, como dito pelo texto de Dario Saltari também para L’Ultimo Uomo, e referência para esta coluna.

O futebol de Juric pertence claramente à tendência de inspiração alemã, em que o jogo sem bola é privilegiado em relação ao com bola. Um futebol dominado pelo refinamento da transição defensiva. O jogo de Juric, no entanto, difere do da escola alemã pelo uso de marcações feitas pelo homem, na transformação do campo em território de sobrevivência de duelos individuais. 

Basta olhar para as estatísticas do Torino levantadas pelo texto de Emanuele Atturo para L’Ultimo Uomo. É o último na estatística de PPDA, ou seja, para o número de passes permitidos às equipes adversárias antes de perder a bola; é a segunda equipe da liga pela altura do centro de gravidade, a primeira pela dominação territorial, a segunda pelas recuperações de bola ofensivas, a primeira pela percentagem de duelos ganhos, a segunda pela altura média das intervenções defensivas.

O texto de Emanuele Atturo também explica a dinâmica dos sistemas de marcação granata em comparação ao de Gasperini: 

O que mais chama a atenção, no entanto, são as estatísticas sobre o controle da bola e a perícia técnica com que ela é tratada. Se seu professor, Gasperini, faz uso das ferramentas do jogo de posição no controle da bola, Juric propõe princípios muito mais enxutos, que reduzem a complexidade ao osso (talvez também para atender às características de seu elenco). O Torino é apenas o décimo quarto em precisão de passes, o primeiro em passes longos errados, o primeiro em duelos aéreos disputados.

Como dito pelo texto de Atturo, o time de Juric mostra que jogar a bola, saber manipulá-la, para uma equipe com poucos recursos técnicos, é o mais difícil. O problema é que a técnica não pode ser ensinada, ou pelo menos pode ser feita até certo ponto.

Mas se pode escolher um caminho mais fácil se, no elenco, as habilidades atléticas excederem em muito as técnicas: a corrida, a intensidade, o ritmo, a aplicação tática, são coisas sobre as quais um treinador tem grande espaço para trabalhar e melhorar. Por conta disso, hoje o Toro tem a terceira melhor defesa da Serie A italiana. 

Por trás da intensidade física e da agressividade, o Torino comandado por Ivan Juric tenta esconder a necessidade de minimizar os riscos na defesa com princípios distintos, que procuram equilibrar o que há de melhor em cada um dos sistemas táticos mais diversos.

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