Como Pioli pode sobreviver ao Milan?

Como todos já sabemos, Marco Giampaolo confirmou sua morte anunciada no Milan. Uma morte que teve data marcada por vários motivos, mesmo com uma melhora ligeira na vitória diante do Genoa, a última antes da atual data FIFA.

Se pode listar os pontos que fizeram Giampaolo cair. Primeiramente, os resultados, em vista que o Milan perder 4 dos seus primeiros 6 jogos era algo que só tinha acontecido na temporada 1930–31. Não bastasse isso, nestes 6 jogos, os rossoneri só marcaram 4 gols, e metade deles ainda com cobranças de pênalti.

Em meio a crise ofensiva, a utilização de Rafael Leão, e principalmente, de Lucas Paquetá, que já se foi dito pra ser “menos brasileiro em campo”, no sentido de ser menos individualista e mais coletivo, menos driblador e mais objetivo, no que foi respondido por Paquetá no Instagram com um vídeo de dribles seus com “orgulho de ser brasileiro”.

Na fase defensiva, o Milan sofreu com maus bocados em partidas específicas, como no Derby diante da Inter, contra o Torino, e a gota d’água sendo na derrota para a Fiorentina por 3–1, com o show de Ribéry e Chiesa na criação de jogadas contra uma defesa que parecia tonta, e com críticas especialmente na função dos laterais, seja Calabria ou Ricardo Rodríguez, quando escalado.

Os principais atributos de Giampaolo no Empoli e na Sampdoria, que o fizeram chegar ao Milan, eram favorecer o ataque e ter um bom histórico de desenvolver jovens, essencial para um clube grande que precisa renascer. Mas em seu pouco tempo, nem o ataque fazia gol e nem os jovens eram frequentemente usados com padrão.

Isso acabou revoltando especialmente Zvonimir Boban, diretor esportivo rossonero, que questionou Giampaolo nos bastidores, e depois de tantas frases, acabou demitindo-o assim que se acabou o fim de semana da vitória contra o Genoa.

Depois de tantas brigas e tantos problemas, no fim Giampaolo foi demitido, e virou o técnico mais “breve” da história dos rossoneri. Como substituir? Trazer alguém a altura do clube? O Milan tentou Spalletti de primeira, mas como Inter e o treinador toscano não se acertaram, restou a aposta em Pioli.

Em meio a esse furacão, como foi escolhido alguém tão rejeitado pela torcida como Stefano Pioli, que foi já rechaçado pelos tifosi milanistas por ser interista, não ter bons resultados, não ter preocupações defensivas, o sistema ofensivo não funcionar tão bem, ser careca…

Pode-se pensar que o Milan escolheu Pioli porque seu histórico é de sempre procurar trabalhar com as opções que se tem disponível no elenco, razão pela qual a Inter chamou-o em 2016–17 para o lugar de Frank De Boer. Já foi descrito como um “normalizador”, mesmo que na primeira coletiva rossonera tenha dito que queria um jogo preciso com “Quero ideias, intensidade e irreverência”.

Para os milanistas, a esperança pra quem sonha com um retorno a Champions League é sonhar com um bom trabalho como o da Lazio de 2014–15, que chegou a final da Coppa Italia contra a Juventus, e que chegou no terceiro lugar do campeonato, a melhor campanha de um time treinado por Pioli e que classificou os laziali a sua última participação na maior competição de clubes do mundo.

Mas como emular essa Lazio com o atual Milan? Primeiro, vamos lembrar dos módulos de jogo, os esquemas táticos que Pioli usou naquela temporada em que teve sua segunda maior média de pontos, por volta de 1,58 por partida:

Na maioria das vezes, em 27 jogos do campeonato, foi utilizado o 4–3–3. Nesse esquema, o time-base com a maioria dos jogos era como: Marchetti; Basta, De Vrij, Cana, Radu; Parolo, Biglia, Lulic; Candreva (Felipe Anderson), Klose, Mauri.

Sobre o 4–3–3, destaco outra vez um texto do L’Ultimo Uomo, publicado por Federico Aqué em 19 de dezembro de 2014:

No 4–3–3, o jogo se desenvolve de maneira mais fluida e perigosa. Mas, acima de tudo, todos os jogadores parecem mais à vontade, em mais posições “suas”. Um dos pilares do jogo de Pioli é a flexibilidade, ou a troca frequente de posições durante o jogo, e o trio central, Biglia-Lulić-Parolo, é provavelmente o melhor da Série A em termos de dinamismo.

Em alguns jogos, especialmente nos clássicos, Pioli passou a utilizar o 4–2–3–1. Nesse esquema, o time-base por sua vez, era como: Marchetti; Basta (Cavanda), De Vrij, Cana (Maurício), Radu (Lulic); Biglia, Parolo; Candreva, Mauri (Cataldi, Keita), Felipe Anderson; Klose (Djordjevic).

Naquele esquema tático, em jogos como o primeiro Derby da capital de 2014–15, terminado em 2–2, o time de Pioli oficialmente era um 4–2–3–1, mas que taticamente se portava com um 4–4–1–1 na fase defensiva, e que chegava a virar um 4–2–4 na ofensiva, naquela tarde chegando a fazer Mauri jogar no centro do ataque junto com Djordjevic (depois substituído por Klose).

Nessa mudança de esquema tático, foi especialmente uma tentativa de Pioli de acomodar um jogador que tinha seu melhor momento, como era Felipe Anderson, mas sem perder o melhor momento de outros, como Candreva e Mauri, que também fez a função de trequartista no 4–2–3–1.

Com Felipe Anderson, a movimentação entre o lado esquerdo e meio-campo era evidente desde o começo. Na imagem abaixo, um exemplo dessa movimentação, somada a troca de passes rápida. Basta lançou Felipe Anderson e sua movimentação atraiu o zagueiro da Atalanta. Álvaro González tabelou com o brasileiro, e cruzou pra Mauri marcar.

Nesta imagem, a movimentação de Felipe Anderson pelo lado esquerdo auxiliou a jogada do primeiro gol laziale diante da Atalanta em 2014–15 (foto: L’Ultimo Uomo)

No atual elenco milanista, a função de Felipe Anderson pode ser projetada principalmente em Lucas Paquetá. Ambos tem experiência pelo lado direito (embora Felipe jogue e viveu seu melhor momento pelo esquerdo), e tem experiências como trequartista já em suas carreiras na Itália. Os melhores momentos de Felipe Anderson, hoje no West Ham, foram com Pioli. Com Paquetá será o caminho?

Piatek em um 4–2–3–1 pode ser mais acionado em relação ao período isolado que ficava com Giampaolo. Por outro lado, se pensarmos em um 4–3–3, Piatek teria de dividir protagonismo com Rafael Leão, que teve seu grande momento no Lille como referência no 4–2–3–1, mas que mostrou poder ser utilizado no lado esquerdo no 4–4–2.

Nesse aspecto, um 4–3–3 pode ser armado com Suso pela esquerda. Ainda há também a opção de Bonaventura no lado direito por esse esquema, que foi utilizado por Giampaolo diante a partida contra o Genoa, embora foi criticado por colocar no banco Paquetá e Rafael Leão.

Por outro lado, neste esquema Rafael Leão e Piatek não jogaram juntos. Poderá sobrar pra um dos dois atacantes. Neste caso, Pioli tem histórico de adorar centroavantes de muita movimentação e que criam espaços para que não apenas as ações ofensivas sejam restritas a eles, embora seja mais adepto a ter centroavantes fixos.

Entre esses exemplos de jogadores, Pioli teve Klose, que era perfeito na movimentação sem a bola e criava espaços para os outros. Além de outros que criavam espaços para entradas e ajudavam a manter a posse, como Djordjevic e Simeone, ou mesmo Muriel que assim como os outros dois auxiliava no retorno da marcação e compensava na velocidade. E Icardi, que é fatal dentro da área.

De preferência, Pioli precisa resolver um problema que se tornou constante na era Giampaolo: o isolamento de Piatek. Aqui, nesta imagem do jogo contra a Fiorentina, em excelente passmap feito pelo não menos excelente post do L’Ultimo Uomo escrito novamente por Federico Aquè.

O Milan de Giampaolo: tentativas de trocas de passes, e Piatek isolado (via: L’Ultimo Uomo)

Por outro lado, como o autor ressalta em outro post, Pioli pode recuperar Piatek de início fazendo ele se preocupar menos com as ações de jogo coletivo, e reduzir sua participação na fase defensiva, por exemplo, concentrando apenas no que o polonês é: um grande finalizador.

Voltando ao jeito de ser e de jogar de Pioli, é fundamental a função do regista. E nesse caso, em seu melhor momento na Lazio, era com Parolo e Biglia, o qual reencontrará no Milan, e por segurança, pode fazer jogar ao lado de Kessié ou Bennacer no meio-campo, seja pra funções defensivas, ou especialmente na fase de saída de jogo.

Papel de Biglia na Lazio em uma imagem: a roubada de bola e o início da jogada (via: L’Ultimo Uomo)

Uma característica daquela Lazio que pode ser emulada no atual elenco do Milan: a troca de passes rápida com a troca de posições já ressaltada. Muitos dos jogadores participam das transições e quando conseguem recuperar a bola, principalmente em áreas altas, gera perigo, pois possui jogadores capazes de trocar a bola no pé com rapidez e qualidade (Candreva, Felipe Anderson e Keita, por exemplo).

O elenco atual do Milan tem jogadores que podem proporcionar isso, como Paquetá, Suso, Bonaventura, e até mesmo os atacantes podem participar disso. Mesmo nos momentos difíceis de Gattuso e Giampaolo, se imagina um dinamismo nos jogadores deste time.

Por outro lado, era um jeito de se defender, que já no período laziale exigia energia e concentração: as coberturas devem ser pontuais; caso contrário, a equipe é descoberta e a defesa é facilmente atacada, o que gerava problemas quando enfrentava, por exemplo, adversários de velocidade, e aconteceu com frequência no último trabalho de Pioli, na Fiorentina.

Uma marca da Lazio de Pioli em 2014–15: a pressão alta do ataque sobre a defesa adversária, aqui no gol de Felipe Anderson diante do Parma.

Mas pra fazer dar certo, é preciso um fator difícil para as gestões do Milan nos últimos anos: continuidade. Claudio Lotito manteve Pioli em 2014–15 mesmo após perder 3 das 4 primeiras rodadas de campeonato. Em uma situação semelhante no atual estágio da temporada seria difícil não ter no mínimo uma grande pressão.

Pensando em seu último trabalho, na Fiorentina, Pioli utilizou mais o 4–3–3 tanto na primeira quanto na segunda temporada. Era um meio de aproveitar um trio ofensivo que tinha Chiesa, Simeone e Théreau na primeira temporada, e que ganhou os reforços de Muriel e Pjaca na temporada seguinte.

Mas que era extremamente vulnerável defensivamente, mesmo quando tinha a liderança do eterno capitão Astori ao lado de Pezzella. Na segunda temporada com Pezzella e Vitor Hugo, com laterais irregulares e sem a presença de Badelj no meio, o time sofria diversas vezes com contra-ataques e com vários ataques.

Por outro lado, era uma Fiorentina com ideias claras de jogo: a pressão alta, marca de Pioli, com um outro tipo de pressão, baseada no homem, com uma linha de quatro defensiva que poderia se tornar linha de três quando a posse de bola era viola.

Daí, com os avanços, especialmente de Biraghi pela direita, a tensão vertical com a bola, forçando as jogadas a abrir as equipes adversárias, recuperando a bola e começando a criar as jogadas já em áreas avançadas. Um estilo de jogo que Pioli pode implantar no Milan.

Pioli pode pensar nesse aspecto tendo em vista os laterais-esquerdos que possui, tanto Ricardo Rodríguez, que já produziu melhor ofensivamente no passado, quanto principalmente Theo Hernandez, mas pra isso, precisa fazer Calabria ou Conti virarem zagueiros na hora da saída de jogo. Ou, assim como na Fiorentina, transformar um zagueiro, como foi Milenkovic, em lateral.

Linha de 3 com a bola que a Fiorentina fazia com Pioli na saída de jogo (Foto: L’Ultimo Uomo)

Ter jogadores como Chiesa e Muriel ajudou pra que sua proposta de jogo ofensiva funcionasse melhor na Fiorentina ofensivamente, protagonizando jogos com muitos gols no ataque. Por outro lado, era um time que apesar de fazer muitos gols, sofria muitos, o que lhe custou muitos resultados.

E Pioli na Fiorentina sofreu também com algo que será inevitavelmente presente em Milanello: a instabilidade eterna. Porém, se na Viola isso era causado pela possível, e agora concretizada, saída dos Della Valle da presidência, no Milan é causada pela frigideira que é o banco rossonero.

Além disso, os trabalhos de Pioli, seja o penúltimo na Inter, ou o último na Fiorentina, alternaram grandes momentos onde parecia que o time iria embalar, com outros que o time entrou em crise de jogo e que o time não se entendia, além de diversos problemas físicos, por exemplo.

A escolha de Pioli é sobretudo, corajosa por parte do Milan, mas é lotada de questões. Conseguirá Pioli equilibrar os rossoneri e levar o Milan as copas europeias? Conseguirá o treinador trabalhar em um ambiente de tanta pressão e que se mostrou uma frigideira de técnicos?

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