O que falta ao Napoli para levantar o Scudetto?

Em certos momentos do campeonato, o Napoli de Spalletti empolgou, mas as coisas empacaram: e agora?

A disputa de título da temporada da Serie A continua, e com mais quatro rodadas entre Milan e Inter, com os rossoneri em vantagem, ainda mais após a derrota interista no jogo a menos. Mas o destaque negativo das últimas semanas foi a queda de desempenho do Napoli de Luciano Spalletti. Onde estiveram os erros?

É difícil explicar como uma equipe que empolgou em certos momentos perdeu tanto o fio da meada ao longo do campeonato, mas como em uma espécie de “Dia da Marmota”, decepcionou seus tifosi. Vale lembrar que nas 12 primeiras rodadas, os napolitanos não apenas estiveram invictos e no topo, como venceram onze destes duelos.

Naquele momento, o Napoli fazia muitas coisas diferentes dos períodos anteriores de treinadores. Além da solidez defensiva, com uma abordagem simples, sem prisão a ideologias, Spalletti permitiu que todos os jogadores do elenco, especialmente aqueles desvalorizados pelo período de Gattuso, como Rrahmani, Lobotka e Elmas, fossem úteis. 

O sistema funcionava graças a corridas em curtas distâncias, uma defesa às vezes agressiva, mas também inteligente quando havia necessidade de recuar, as mudanças certas feitas no momento certo por parte do treinador, a uma inteligente mistura de posse de bola e jogo vertical. A expectativa era diferente, como demonstra um trecho do texto “O Napoli derreteu”, de Alfonso Fasano, para a revista Undici:

A pura força de Koulibaly, Anguissa e Osimhen fez o resto: vários jogos devolveram a sensação de que os Azzurri foram fisicamente arrastados à vitória por estes três jogadores, do seu atletismo fora de escala, muito mais do que da técnica de Insigne e Mertens e Zielinski, ou seja, da velha guarda. Talvez seja também por isso que muitos esperavam que as coisas pudessem ser diferentes. Que essa nova equipe, na qual certas qualidades e, portanto, uma certa maneira de entender o futebol se tornaram um condimento saboroso e não o prato principal, pudesse apagar o passado.

Ainda assim, o elenco tinha seus buracos. Desde a janela de verão, após o insucesso da temporada anterior, em que teve a vaga na Champions nas mãos diante do Verona, em que precisava vencer para ir a competição, mas sequer conseguiu vencer, apenas Anguissa (em empréstimo com opção de compra) e Juan Jesus foram contratados, e apenas Hysaj e Maksimovic deixaram o clube. 

Essa parte de buracos por vezes entre novembro e fevereiro era o grande ponto de interrogação. Afinal de contas, como o Napoli iria se virar sem Koulibaly, Anguissa e Osimhen, essenciais em suas seleções para a Copa Africana de Nações, e que se mostravam os melhores nos melhores momentos napolitanos?

Naqueles momentos, o Napoli reagia de formas estranhas. É bem verdade que no período conseguiu vitórias importantes, como no clássico diante do Milan em San Siro, mas sempre ao longo da temporada, depois de uma grande vitória, vinha uma grande derrota. Foi assim nas derrotas contra o Empoli (após o jogo contra o Leicester) e contra o Spezia (após o jogo com o Milan).

Em janeiro e fevereiro, o Napoli até que se virou bem, então se esperava que aos poucos, os napolitanos, com a volta dos africanos e com o retorno de jogadores de suas lesões, pudesse competir melhor. Mas não foi o que aconteceu em alguns jogos.

Muito porque alguns jogadores foram abaixo da expectativa, justamente quando se esperava o próximo passo para chegar e se manter no topo. Como Fabián Ruiz, Zielinski, e até mesmo Insigne, que ao mesmo tempo que teve uma temporada prolífica de gols, a muito se deve pelas cobranças de pênalti.

Vale ressaltar que o Napoli teve muitos problemas com lesões, especialmente musculares ao longo da temporada, o que não sofria antes da pandemia, e as falhas desse apagão físico poderiam ser atribuídas a Spalletti e sua equipe, a uma preparação atlética que teve diversos problemas. Na atual temporada, todo o elenco napolitano se lesionou por pelo menos uma vez. 

Também vale dizer um dilema que os treinadores do Napoli tem de resolver: como um time treina tão fluido, tão mutável? Como faz coexistir as necessidades de jogadores como Mário Rui, Insigne e Mertens com as de Koulibaly, Anguissa e Lozano, além de Osimhen, e como realizar isso ao longo da temporada?

Este fato poderia, por exemplo, explicitar como, após uma temporada muito participativa de jogadores como Zielinski, Insigne, Politano e Lozano em 2020–21 com Gattuso, dos 52 gols marcados pelo Napoli com bola rolando, 26 estão divididos entre Osimhen, Mertens e Fabián, especialmente entre os dois primeiros, já que o espanhol o fez todos em chutes de longa distância. 

Mesmo Insigne, que antes fazia boa parte dos seus gols com bola rolando, só marcou diante de Lazio e Empoli com bola rolando. Politano só marcou diante da Juventus, em setembro, e do Barcelona, em fevereiro. Para não falar de Zielinski, que não marca desde dezembro, e Lozano, com uma temporada abaixo de suas expectativas.

Para Alfonso Fasano, há uma resposta para essas perguntas: O time está treinando e jogando com alta intensidade, que neste caso não significa apenas correr muito com e sem bola, mas sim praticar um futebol feito de perene aplicação tática, em que cada cobertura e cada inserção e cada jogada têm grande importância, visto que são sempre mecanismos diferentes a serem suportados, a serem implementados.

Spalletti escolheu esta estrada híbrida porque tinha e ainda tem uma equipe híbrida, a ser montada semana após semana. Uma situação igual, mas diferente da de Sarri e também de Benítez e Mazzarri, os treinadores do Napoli que lutaram por grandes objetivos antes dele: tinham um staff talvez menos forte e menos profundo, mas construídos de forma mais coerente e, por isso, conseguiram criar sistemas táticos decididamente identificáveis ​​e indubitavelmente mais eficazes.

Pra piorar, em diversos momentos da temporada, o Napoli tem sentido o emocional em situações curiosas. Se antes o San Paolo (ou Diego Armando Maradona) era uma fortaleza, nesta temporada, o time faz sua pior campanha desde 1997–98, em que perdeu 11 jogos em casa em todas as competições, no ano do rebaixamento do clube. Nesta temporada, os napolitanos já perderam 8.

Coisas estranhas acontecem com o clube nessa temporada, que poderia ser apenas de aplausos. E por diversas vezes derrotas inexplicáveis aconteceram, e por vezes passavam a sensação de que esse elenco do Napoli, que foi capaz de num passado recente, vencer duas vezes o Liverpool de Klopp, fosse também capaz de perder partidas como a diante do Empoli, em que permitiu uma virada de 2 a 0 para 3 a 2, em um contexto que o clube não sofria há 80 anos, diante de uma equipe toscana que não vencia desde dezembro de 2021 na liga, quando venceu… o Napoli.

Por diversas vezes, o elenco napolitano foi acusado de ter muitos problemas de mentalidade. E a situação parece ter piorado, especialmente depois que Hamsik deixou a faixa de capitão para se transferir ao Dalian Yifang, em 2019. Insigne o substituiu com a faixa, mas a liderança, faltou por diversas vezes, o que é muito contestado desde 2019, seja pelas brigas com Ancelotti, ou seja pelo famoso caso do “motim” de concentração no mesmo ano, que ajudou a rachar o elenco na ocasião e a queda do treinador. 

É também verdade que o elenco é essencialmente mais do mesmo há muitos anos. Segundo dados do CIES, o Napoli é a equipe da Serie A italiana, entre as que nunca foram rebaixadas no período analisado, que utilizou menos jogadores (67 no total) de 2015 até hoje.

Foi uma temporada em que não se tinha tanta expectativa do Napoli por tudo o que aconteceu na temporada anterior. Afinal, vale ressaltar que o atual elenco era quase o mesmo de 2020–21, e portanto, o mesmo que tropeçou na hora H daquela temporada.

Ao mesmo tempo, se esperou nos últimos anos que o Napoli como time, e que seus jogadores dessem o próximo passo. E no fim das contas, o clube, como uma das grandes camisas e forças da Itália, teve jogadores e dirigentes que estão a um passo de distância da elite, mas estão fora dela. 

Para Fasano, isso colidiu com o declínio fisiológico de seu próprio modelo. E com a falta dessas alternativas que a comissão técnica de Spalletti e a diretoria do Napoli não construíram, que não puderam e/ou não quiseram construir. Houve quem tenha parado um pouco antes do final do campeonato e das copas internacionais, como Mazzarri, e houve quem conseguiu levar o Napoli a um passo do Scudetto ou da final da Liga Europa, como Sarri e Benítez. 

Spalletti, teoricamente tinha mais alternativas que seus predecessores, a certa altura, a capacidade, neste caso física, mais do que técnica e emocional, de jogar em alta intensidade se esvaiu. Ou seja, como mencionado, o que era necessário para explorá-los bem, essas alternativas. 

Mas também é verdade que o treinador toscano, assim como Gattuso, sofreu muito mais com o declínio da preparação física do Napoli, que era de excelência nos tempos de Benítez e Sarri. Certamente Spalletti cometeu alguns erros, mas esse é o risco que se corre com o “calcio líquido”: não há mecanismos enraizados, aos quais se pode agarrar em momentos de dificuldade. E qualquer mudança é potencialmente um ato negativo.

Sendo as mudanças uma potencialização de atos negativos, se explica o porque alguns jogadores tem dificuldades em alguns fatores essenciais para o funcionamento da equipe, como a do goleiro Meret, contratado com Ancelotti, que não utiliza saída por baixo, ter de fazer isso tanto com Gattuso, quanto com Spalletti, ido ao banco, e quando volta ao time titular, falhar justamente nisso, como no bizarro 2º gol do Empoli na vitória por 3–2, para não falar de outros momentos de dificuldade. 

As mudanças acabaram prejudicando alguns pontos no Napoli justamente quando se espera que, com elas, se desse o grande passo, o decisivo, que separa os campeões dos não-campeões. De quem faz história contra quem fica à margem dela. Por diversas vezes se espera que todos no clube napolitano tenham ambição disso.

Mas, afinal, seria tudo isso por parte do Napoli um símbolo de falta de ambição por parte de quem faz o clube? A entrevista de Aurelio De Laurentiis durante a semana para a Sky Sport italiana pode indicar que o clube não esperava um Scudetto, e que o foco era apenas a vaga na Champions. 

Para muitos torcedores, a falta de ambição emperra o Napoli. Justo a falta de ousadia, de um clube que em seus grandes momentos na história, primou pela ousadia. Os tifosi azzurri não perdoam De Laurentiis pois nas disputas de título anteriores, no período de Sarri, em 2015–16 e 2017–18, a gestão deu ao treinador nomes como Regini e Grassi (2015–16) e Milic (2017–18) para serem “sombra” dos titulares. 

Mas esta derrota em nada tem a ver com as tristes perdas de título da era Sarri contra uma competente Juventus de Allegri. Esta envolve outras situações e com fragilidades maiores de mercado e de uma equipe que, seu núcleo, a exceção dos remanescentes de Sarri (Ghoulam, Koulibaly, Mário Rui, Zielinski, Insigne e Mertens), foi construída a partir de Ancelotti, e praticamente não foi renovada com Spalletti, embora se espere uma renovação maior no futuro. 

E desde então, a exceção do título da Coppa Italia de 2019–20, e especialmente pelos resultados da temporada 2020–21 e dessa temporada, os tifosi napolitanos tem a sensação de que este não é um time de campeões, e que esse elenco não chegará ao sucesso. Vale ressaltar um outro trecho do texto de Alfonso Fasano: 

Afinal, grandes campeões e times vencedores são assim porque encontram forças para reagir às adversidades, às contingências. Exceto que nem todos os jogadores são grandes campeões, e nem todas as equipes podem vencer. Pode parecer uma questão de mentalidade, provavelmente é, mas é acima de tudo e acima de tudo um discurso de força, valor, longe do sucesso. Uma distância tão curta que sempre se vislumbra o grande triunfo, até à última curva. Uma distância tão grande que o grande triunfo ainda não chegou, depois de anos de tentativas frustradas.

Há quem diga que o Napoli nunca mais terá uma oportunidade como essas. Como há quem ressalte que olhando tudo o que esse elenco produziu, ou não, a vaga na Champions é muito bem vista e talvez não fosse pra mais do que isso. O fato é que esse time e esse elenco dos azzurri partenopei geram ao mundo, e especialmente a seus milhões de torcedores, mais pontos de interrogação do que certezas. 

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