De 13 para 1: a primeira conquista do Real Madrid na Youth League
Sob o comando do ídolo Raúl González, o Real Madrid conquistou sua primeira Youth League e mostrou jovens com muita capacidade para chegar a equipe principal
Nesta terça-feira, 25 de agosto, o Real Madrid entrou mais uma vez para a história. E não, não foi por conta de mais uma Champions League conquistada, que, por sinal, está em boas mãos em Munique nesta temporada. O clube merengue conseguiu levantar a taça da versão sub-19 da Champions League, a Youth League ao vencer o Benfica por 3×2 no Colovray Stadium, em Nyon, na Suíça.
La Fábrica, apelido carinhoso que carrega os juvenis do Real Madrid, não só conquistou o primeiro título da história do clube como revelou de baciada nomes que podem ser importantes para o futuro.
Os leitores que acompanham esta coluna viram na semana passada uma análise profunda sobre as quatro equipes semifinalistas, dentre elas, obviamente, a equipe merengue. Apesar de desfrutar do sabor da taça pela primeira vez, o Real Madrid apenas confirmou o apelido e a tradição impressionante do clube no torneio mais importante da categoria.
Além de ter participado de todas as sete edições da Youth League, o Real Madrid mantém o recorde de sempre ter passado para as oitavas-de-final. Nesta edição, os merengues empataram com Barcelona e Chelsea em semifinais disputadas (quatro). Ademais, os madrilenos chegaram a 62 jogos, enfileirando 39 vitórias e 159 gols, liderando a Youth League em números totais.
Agora, o Real Madrid se junta a Porto e Salzburg com um título, encostando assim no arquirrival Barcelona e no Chelsea, que têm dois troféus. A pior campanha dos merengues aconteceu na edição 14/15, quando caiu nas oitavas-de-final contra o Porto, nos pênaltis, após empatar em 1×1 no tempo regulamentar. Antes de igualar o recorde de semifinais nesta temporada, os espanhóis haviam chegado a três finais de Youth League, sendo eliminados duas vezes pelo Benfica. Ironicamente, o primeiro título acabou vindo em cima dos algozes de outrora.
O trabalho do Real Madrid com suas canteiras é destacável, tendo sempre revelado um jogador atuante no cenário profissional e que tenha disputado o torneio sub-19. Marcos Llorente (13/14), Sergio Reguilón (14/15), Borja Mayoral (14/15), Achraf Hakimi (15/16), Federico Valverde (16/17) e Óscar Rodríguez (17/18) são alguns exemplos. Llorente e Hakimi, recentemente vendido à Inter de Milão, não possuem mais laços com a equipe, porém, Reguilón, Mayoral, Valverde e Rodríguez fazem parte do elenco ou foram emprestados com o passe ainda atrelado ao clube espanhol.
E quem do elenco campeão poderia fazer parte da equipe principal? O plantel merengue possui uma média de idade elevada, sobretudo o da temporada passada. A média diminui quando Rodrygo e Vinícius Junior são relacionados para os compromissos, além da provável utilização de Fede Valverde, que também é jovem.
Fazer parte da equipe principal, sendo jovem, é muito complicado na equipe mais rica do futebol europeu. Ou o atleta é muito acima da média, ou ele vai demorar a encontrar espaço em meio a tantas estrelas.
Entretanto, quatro jogadores chamaram muito a atenção com a camisa branca, especialmente durante os playoffs sob o comando de Raúl González: Victor Chust, Miguel Gutiérrez, Antonio Blanco e Sergio Arribas. Pela qualidade demonstrada, além da facilidade para disputar posição, a chance de esses nomes aparecerem no elenco principal nos próximos anos é plausível.
Victor Chust vestiu a braçadeira de capitão da equipe nas duas últimas edições da Youth League. O zagueiro merengue, que disputou três edições seguidas do torneio, tem 20 anos e demonstrou muita frieza e segurança no afunilamento dos playoffs. Chust se encaixa no estilo de defensor madridista, sendo rápido e com tempo de bola afinado. O jovem ainda precisa melhorar fisicamente, mas os principais requisitos ele já possui.
Falando em perfil madridista, Miguel Gutiérrez, lateral-esquerdo de 19 anos, também conhecido como Guti por alguns torcedores, tem um estilo muito semelhante ao de Sergio Reguilón, que esteve emprestado ao Sevilla na temporada passada, mas que conseguiu ter uma sequência pelo clube merengue quando fora exigido. Guti é um lateral propício para linha de quatro, especialmente pela grande leitura de jogo. Assim como Reguilón, Gutierréz é muito bom ofensivamente, oferecendo apoios e pisando dentro da grande área para finalizar, conseguindo até anotar seus gols. Com Raúl, o jovem lateral aprendeu a marcar jogadores rápidos, percebendo sua movimentação e fechando espaços para conter jogadas de um contra um.
A grande pérola, o principal atrativo é Antonio Blanco. Preparado para ser o novo Casemiro, o canterano de La Fábrica jogou sua terceira Youth League, assim como Victor Chust. Em sua primeira participação, Blanco começou como reserva, porém, logo na segunda temporada, o jovem meio-campista já figurava como titular. Nesta edição, o camisa 6 mostrou o porquê de tanto burburinho em cima de seu nome. Com desarmes e distribuição de jogo em passes curtos e longos, Blanco chamou a responsabilidade em vários jogos, sendo o fio condutor entre a defesa e ataque.
A partida de oitavas contra a Juventus e a semifinal contra o Salzburg ilustraram em movimento o que Blanco é capaz de agregar a equipe principal. Além de ser o responsável pela armação de jogadas no primeiro e segundo terço do campo, ele serviu muitas vezes como terceiro homem, se desmarcando e oferecendo opção de passe em zonas livres do meio-campo.
O curioso disso tudo é que o sistema base de Raúl nos playoffs fora o 4-1-4-1, no entanto, devido a enorme qualidade associativa do menino de 20 anos, o centrocampista fora capaz de oferecer apoios e desafogos durante momentos cruciais, sobretudo quando o adversário marcava em bloco médio-baixo, algo trivial em partidas da equipe principal, onde o Real Madrid precisa furar bloqueios e abrir espaços. Particularmente, acho a comparação com Casemiro um pouco estranha, apesar de Blanco ter noções defensivas. Todavia, sua movimentação corpórea e a impressão de “falso lento” lembra bastante Toni Kroos.
Se Blanco era a prima-dona, Sergio Arribas foi o que o pessoal da NBA chamaria de “Most Improved Player” (jogador mais aprimorado/melhorado). Arribas é franzino, mede 1,71m e atua no segundo terço. Hoje em dia, especialmente na Europa, o jogador precisa ser extremamente habilidoso para conseguir sobreviver nesta função. Ao contrário de Chust, Guti e Blanco, Arribas não é jogador de seleção de base e um dos motivos para não ser agraciado com convocações é justamente a compleição física.
Todavia, Arribas foi, sem dúvidas, o jogador ofensivo mais importante do Real Madrid durante a caminhada nos playoffs. Contra a Juventus, nas oitavas, Sergito empatou a partida numa grande jogada individual 15 minutos após Jordi ser expulso quando a equipe perdia por 1×0. Dois minutos após igualar o placar, Arribas iniciou a jogada da virada, que terminou com assistência de Morante para o gol de Dotor.
Contra a Inter de Milão, Arribas protagonizou um verdadeiro recital. Após um primeiro tempo truncado, que terminou empatado em 0x0, o meio-campista espanhol criou a jogada do pênalti sofrido Pablo Rodríguez, que Chust desperdiçou. Cinco minutos depois, em jogada idêntica do penal perdido, ele partiu da meia-esquerda e driblou até a grande área para servir Park, que abriu o placar. Minutos depois, ele sofreu o pênalti que Guti converteu para fazer 2×0. O terceiro gol também teve participação direta do pequenino Arribas, que matou a bola no peito e deu um balãozinho para Morante cutucar com a testa.
No entanto, Arribas sofrera muito contra o Salzburg, na semifinal, uma partida muito física. E talvez seja esse o único empecilho para a trajetória do habilidosíssimo meio-campista. Com a bola ao pé, é muito difícil pará-lo. No entanto, contra equipes que imprimem força e combate pela posse no meio-campo, Arribas tende a sofrer.
Na final contra o Benfica, que deixara espaços entre as linhas, Arribas deitou e rolou, especialmente no primeiro tempo, quando fizera a jogada do gol de Pablo Rodríguez. O camisa 22 possui um talento raro, sendo capaz de driblar em espaços curtos, conduzir a bola em alta velocidade e encontrar espaços nas entrelinhas. Diferentemente dos colegas apresentados anteriormente, Sergio Arribas não tem o padrão madridista de imposição e condicionamento físico, porém, é justamente o futebol fantasia do jovem atleta que lhe transforma numa peça única e que, se tiver um cuidado especial, pode virar um jogador histórico na capital espanhola.
Raúl González e sua inteligência
Quem ganha o jogo são os jogadores, certo? Pois bem, dentro do campo isso é verdade, mas campeonatos começam a ser vencidos fora dele. E esse foi um dos maiores trunfos do Real Madrid para conquistar a Youth League na temporada 2019/20.
Raúl chegou para os playoffs pautado pelo bom trabalho no Castilla, a equipe B dos merengues. Ele derrubou Juventus, Inter de Milão, RB Salzburg e o Benfica na final. Foram quatro jogos em 10 dias na bolha de Nyon, enfrentando adversidades (expulsões, suspensões e lesões) e times que eram favoritos contra o gigante espanhol.
Com Raúl no comando, o Real fez 11 gols e tomou apenas quatro na Youth League. O treinador instaurou o 4-1-4-1, que era o sistema que melhor cabia ao material humano disponível no plantel sub-19. Essa tática fez aflorar o futebol de Arribas e Dotor, que eram jogadores de menor impacto na canteira, mas que se mostraram altamente inteligentes. Miguel Gutiérrez aprendeu a defender nesse esquema. Blanco ficou mais responsável taticamente e criou inúmeras jogadas ofensivas. Marvin Park, MVP contra o Salzburg, jogou leve e confiante pela extrema-direta. Raúl deu padrão e identidade aos meninos.
Com a conquista, Raúl González, que fora tricampeão da Champions como jogador, se tornou o segundo na história a também conquistar a Youth League como treinador. Antes dele, Mario Silva, treinador do Porto na temporada passada, tinha conquistado esse feito. Além de revelar grandes nomes no gramado, o Real Madrid tem uma promessa interessante também para o banco de reservas.
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