La Flor de Zidane na Champions; e as eliminações de Barça, Sevilla e Atleti
Dos quatro clubes espanhóis, apenas Real Madrid segue vivo na Champions. Barcelona e Sevilla pagaram o preço dos primeiros 90 minutos e o Atleti foi dominado pelo Chelsea. Mas, detalhadamente, como esses confrontos se desenrolaram?
Na última década, os clubes espanhóis dominaram com propriedade as competições europeias. Além dos jogadores, equipes competitivas e técnicos de primeiro escalão eram os principais reflexos das movimentações dessas equipes. O controle era muito óbvio e de certa forma o campeonato nacional se mantinha competitivo.
Por outro lado, o contexto atual vem se sobressaindo em relação a qualquer coisa. Na atual temporada, os times de todo o mundo enfrentam períodos mais inconsistentes e, de forma compreensível, não conseguem entregar o melhor futebol. Na semana passada, Barcelona e Sevilla acabaram eliminados por Paris Saint-Germain e Borussia Dortmund. Real Madrid e Atleti tiveram confrontos diferentes e abertos a partir do segundo jogo, mas decidido no ritmo de quem se classificou, Madrid e Chelsea.
Os decisivos primeiros 90 minutos
Barcelona e Sevilla pagaram o preço dos erros na primeira partida. As duas equipes tiverem desempenho fundamental para conseguir reverter o placar no segundo jogo, mas não o suficiente para corrigir os erros anteriores.
Na Espanha, Mbappe carregou no colo. Mesmo com posse de bola inferior ao adversário, o PSG conseguiu as maiores chances da partida. Em transição o francês deu show e deixou os defensores para trás na maioria delas. Com o drible mais característico e nas disputas pela bola quase não errou. Porém, apesar de controlar a partida nas chances criadas, o PSG só conseguiu punir em transição de fato no segundo tempo, punindo os erros adversários e condicionando um cenário bem tranquilo para o jogo em Paris.
No segundo jogo, Koeman foi com três zagueiros sendo De Jong um deles. Com a ajuda de Busquets e Pedri, isso visibilizava melhor o passe, com o objetivo de furar as linhas do PSG que, com o placar na mão, optava por um estilo mais reativo do que de costume. E não estava errado Mauricio Pochettino. Se tinha algo a se aproveitar eram os espaços deixados pelos culés pós-perda, mas por outro lado essa pressão do Barcelona após perder a posse era praticamente perfeito.
Apesar de ser fisicamente inferior, o Barcelona conseguiu lidar com a situação e deixou muita esperança pelo futebol jogado no primeiro tempo. O PSG não conseguia se defender com a mesma frieza, e nos contra-ataques Mbappe não encontrava os mesmos espaços para atacar. Tudo estava muito certo para o Barcelona colocar a pressão necessária. A intensidade era ótima e os jogadores pareciam confiantes de que era possível. Mas Keylor Navas, como nos últimos anos, teve uma noite maravilhosa de Champions.
O “se” é muito subjetivo, mas o pênalti de Messi, que foi defendido pelo costa-riquenho, mudaria o panorama da partida. Porém, era claro que, fisicamente, o Barcelona não aguentaria jogar com a mesma intensidade durante 90 minutos. O golpe mental do pênalti perdido foi um motivo a mais para isso. Voltar para o segundo tempo com um 2×1 no placar daria ainda mais ânimo para o Barcelona, mas não foi o que aconteceu. A ideia inicial de Koeman foi muito bem pensada e projetada dentro de campo, mas infelizmente (ou felizmente, depende do ponto de vista) do outro lado tinha um dos goleiros mais decisivos em Champions League nos últimos anos.
Os erros e displicências no primeiro jogo deixaram o Barcelona atrás do placar, e com isso precisava de muito mais do que uma boa escalação. O mental do elenco é cada vez mais contestado desde a eliminação para Roma e Liverpool. Por outro lado, a equipe tinha boas experiências de recuperação em confrontos de mata-mata na atual temporada – contra o Granada e o Sevilla na Copa do Rei, por exemplo.
Apesar da eliminação, os blaugranas caíram de pé. O placar do primeiro jogo machuca de fato, mas a partida em Paris demonstra que lidar com as fragilidades do elenco atual não é um bicho de sete cabeças como foi transparecido na última temporada. Para conseguir a recuperação completa pelo título da La Liga, é fundamental manter esse pensamento e coerência do que o time pode oferecer dentro de campo, e Koeman parece ter uma boa noção disso.
Cometa Haaland não tem jeito. A jovem estrela precisa de muito pouco para marcar um gol e o Sevilla já vinha sofrendo na defesa em 2021. Na Champions não foi diferente. Dortmund precisou de pouco para chegar à meta de Bono e era muito firme no que se propôs a fazer.
Atrás do placar, era normal os espanhóis irem ao ataque. Com uma vantagem gigante fora de casa, também era normal os alemães diminuírem o ritmo ofensivo. Mas a efetividade foi resumida ao gol de De Jong poucos minutos antes do fim da partida. Os gols fora de casa eram uma segurança para o Dortmund, mas a instabilidade do time dava certa ilusão ao Sevilla de que poderia reverter na volta.
Assim como o Barcelona, fizeram ótimo jogo na volta. Intensidade, setor criativo eficiente, mas pecaram nas conclusões. O BVB, em um jogo reativo quase perfeito, não teve compaixão e abriu o placar em mais um erro de encaixe da primeira linha do Sevilla. Foi o balde de água frio aos 35 minutos do primeiro tempo. Era difícil imaginar uma recuperação, não só pelo contexto, mas pelo que o time de Lopetegui poderia comprometer defensivamente, e assim Haaland castiga demais.
O agregado era de 5×2. Mas os jogadores conseguiram manter a intensidade, criando até mais do que no primeiro tempo e as movimentações de En-Nesyri foram fundamentais para tirar a previsibilidade que seria o cenário perfeito para os adversários. O pênalti deu vida, a partir dele era preciso dois gols, e não poderia tomar mais nenhum para jogar uma prorrogação. Conforme o tempo foi passando, o nervosismo aumentou, e mesmo que a produção ofensiva fosse de fato estimulante, a falta de efetividade se aliou a ansiedade.
O segundo gol veio, mas tarde demais. Faltando um minuto, o centroavante marroquino ganhou a bola aérea e marcou depois de grande cruzamento de Rakitic. No último segundo, Diego Carlos ainda teve chance de fazer história, mas preferiu o passe à finalização. Os erros do primeiro jogo pesaram em mais um confronto.
O sufoco e a pressão exercida no segundo jogo eram indispensáveis no primeiro e o Sevilla acabou eliminado. A vaga na Champions para a próxima temporada deve ser conquistada pelo campeonato espanhol. O time ainda é muito coerente dentro das ideias de Lopetegui e precisa de pequenos ajustes para alcançar o próximo passo.
Soberania em um jogo de xadrez
No jogo de ida tivemos Thomas Tuchel dominando Diego Simeone. Os planos do alemão foram perfeitos para neutralizar o jogo do Atleti. Primeiro vem o trio de meio-campo com Jorginho, Kovacic e Mount, depois temos o sistema. Muito parecidos no papel, as duas equipes utilizam três zagueiros na primeira linha, um atacante um pouco mais centralizado (Giroud e Suárez) e um atacante flutuando na entrelinha.
Além de conseguir o controle da partida com o trio do meio, Tuchel conseguiu reduzir o futebol reativo dos colchoneros, não deixando a equipe transitar com espaços para atacar após recuperar a bola. Ali tudo foi bem preparado pelo alemão, e o contexto era completamente favorável, mas o Atleti ainda defendia muito bem. Simeone exagerou na “retranca”? Talvez, mas o mérito maior é de Tuchel, que conseguiu manter seu time no campo de ataque e sem deixar espaços para o melhor desempenho do adversário no contra-ataque.
Numa escalação com três zagueiros é natural que os alas recuem quando o time não tem a posse – na mesma linha ou mais avançados que os centrais. No Atleti não foi diferente. Apesar da “revolta” pela tal “retranca”, o recuo de Angel Correa acontece por conta das possíveis infiltrações do Chelsea pelo lado esquerdo, tanto pelas movimentações dos atacantes, quando pela chegada de Marcos Alonso. Além disso, os zagueiros ganharam maior presença no campo de ataque, deixando Hudson-Oddoi sem tantas preocupações defensivas.
O Atleti não conseguiu ser reativo como se imaginava e o Chelsea não permitia contra-ataque pela pressão que os volantes fizeram. Apesar do “campo neutro” na prática, o Chelsea conseguiu sair com a vitória num jogo que parecia seguir para um 0x0 suficiente aos olhos de Cholo. E assim, o time inglês seguiu com a vantagem do gol fora de casa, que poderia ser muito maior se o Atleti cedesse espaços para tal.
O começo da segunda partida demonstrou a ideia de Simeone em pressionar um pouco mais avançado, algo claro incitado verbalmente por ele na lateral do gramado. Assim como um jogo de xadrez, tudo foi muito bem pensado. Um precisava do placar e tinha a necessidade de avançar suas linhas para isso, mas o outro tentou ao máximo aumentar sua vantagem desde o começo, sem deixar o ritmo a favor do adversário, tudo sob controle com base no pós-perda. E foi assim durante todo o confronto.
Depois do gol de Ziyech as chances do Atleti diminuíram ainda mais. Simeone não conseguiu fazer mágica. Para se recuperar no segundo tempo, e pôr fim conseguir superar a pressão incrível que Tuchel programou para o confronto, teria que fazer mágica. O controle e domínio dos blues por 180 minutos foi ilustrado pelas pouquíssimas chances dos espanhóis nas duas partidas – apenas cinco chutes na meta de Mendy.
Simeone tem a liderança da La Liga e ótimos recursos para se manter no topo até o final. Porém é claro o baque sofrido por ser seguramente a pior eliminação do Atleti nos últimos anos, muito disso por não conseguir se impor em nenhum momento diante de um adversário que, no papel, não é tão superior como foi em campo.
Madrid sublime segue vivo
No jogo de ida a Atalanta ofereceu pouco perigo ao Real Madrid. A expulsão tão cedo atrasou todos os planos de Gasperini e no último terço a equipe não criou nada – nenhum chute no gol durante os 90 minutos e apenas 33% de posse de bola. Já o Real Madrid, desde os 17 minutos com um a mais, não conseguiu demonstrar superioridade que o papel indica. Essa situação expôs completamente o sistema ofensivo da equipe de Zidane que não conseguiu se desvincular da retranca italiana.
O gol de Mendy foi maravilhoso, mas não deu a vantagem esperada pelas circunstâncias da partida. O confronto estava aberto, a Atalanta precisava de uma vitória no Di Stefano e a irregularidade do atual Madrid não impedia que isso fosse improvável.
No jogo de volta, em uma situação um pouco menos desconfortável, Gasperini conseguiu impor seu estilo. A capacidade da Atalanta em recuperar a bola ainda no campo de ataque, forçando a saída de bola merengue – que não é uma coisa muito eficiente apesar de ter Toni Kroos e Luka Modric a disposição – era o melhor cenário para reverter o placar do primeiro jogo. Por outro lado, no seu próprio campo não teve a mesma capacidade que eventualmente tem quando sobe os blocos. Os espaços na defesa são expostos quando o Madrid consegue sair da marcação em seu próprio campo – talvez a melhor situação em que a equipe de Zidane consegue produzir desde 2019.
Essa ideia se concretiza quando os madridistas diminuem a intensidade da partida, que é completamente a favor da energia que a Atalanta transmite em pressão alta. Os três zagueiros liberam Vázquez e Mendy para arrancadas, ou até mesmo Nacho, que conseguiu suas corridas em algumas situações. Essa presença impede erros mais óbvios como contra o Manchester City na temporada passada, por exemplo. Benzema abre o placar após um erro de Sportiello que entrega a bola nos pés de Luka Modric. Controle do jogo e placar favorável.
O segundo tempo foi ainda mais cômodo para Vini Jr fazer seus arranques e criar as principais chances da partida. Uma jogada sublime com espaço para atacar, Vini sofreu a falta dentro da área e consegue colocar o Madrid nas quartas da Champions com uma das melhores performances individuais desde que chegou ao clube.
A inconsistência na atual temporada deixa muitos problemas expostos e na Champions League não vai ser diferente. Por outro lado, enfrentar a Atalanta por 180 minutos e sofrer apenas um gol é um resultado, como um todo, muito interessante para o restante da competição.
Sendo o único espanhol vivo na Champions League, a equipe ainda tem duas competições para jogar, enquanto os rivais na briga pelo título da La Liga têm o campeonato como foco principal. É improvável imaginar que Zidane consiga ser campeão nos dois campeonatos, mas depois de um título espanhol na temporada passada, é compreensível que o time foque na competição que traz La Flor de Zidane aos jornais novamente.
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