A nova identidade ofensiva do Boca Juniors

Após período de baixíssima produção e com grandes dificuldades de se organizar na frente, o time xeneize parece ter encontrado seu caminho para as redes

Embora Miguel Ángel Russo tenha ajudado o Boca Juniors a conquistar um título argentino logo em sua chegada no começo de 2020, colaborando com uma arrancada final invicta, a maior parte de sua passagem mais recente por La Bombonera foi de problemas. Em especial, chamava atenção o rendimento ofensivo ruim exibido pelo time, que mesmo no melhor momento, tinha limitações perceptíveis.

A dependência direta das atuações de Carlos Tévez e apresentações coletivas que mostravam a falta de repertório da equipe para ameaçar os adversários eram constantes, agravadas pelas escassas alternativas de elenco. Tanto que, na reta final do trabalho de Russo, o Boca amargou sequência de apenas uma vitória em 10 jogos, e indo às redes em apenas 4 das últimas 16 partidas sob o seu comando. Por conta disto, a demissão foi inevitável e a aposta para tentar repaginar o comportamento do time em campo foi Sebastián Battaglia.

Então treinador do time de reservas, foi promovido no último mês de agosto de maneira efetiva, mesmo com sua pouca experiência na função. Não por acaso, seu contrato foi firmado com validade apenas até dezembro. Mas este detalhe não tem sido empecilho para o ídolo do clube e multicampeão nos anos 2000. Propondo boas soluções táticas e obtendo retorno técnico positivo de jogadores formados na base, vem conseguindo sucesso nessa dura empreitada.

Como o Boca Juniors se organiza em campo?

Apesar de Battaglia já ter utilizado o 1-4-3-3 e o 1-4-2-3-1 em jogos pontuais contra Patronato e Godoy Cruz respectivamente, o predomínio maior é de esquemas que privilegiam uma linha de três meio-campistas logo à frente da zaga, sem o uso de extremos no campo de ataque. Assim, a maior parte dos compromissos são disputados com o 1-4-3-2-1, o 1-4-3-1-2 ou o 1-4-1-3-2 como estrutura-base daquilo que se emprega durante os 90 minutos. O fato é que, acima de tudo, se deve levar em consideração as funções em campo no caso do Boca.

Com a bola rolando, é possível perceber uma saída que costuma ser protagonizada pelos zagueiros, com ambos distribuindo o jogo para a linha de meias e laterais que fica adiante num desenho de 2+4, recebendo o suporte do goleiro, caso necessário, mais atrás. Porém, não é raro ver o primeiro homem de meio recuando entre os dois defensores para criar superioridade em alguns momentos.

Saída de bola do Boca Juniors performada com a dupla de zaga na primeira linha e quatro jogadores à frente

Para levar essa bola do campo defensivo até a intermediária ofensiva, um dos jogadores que mais geram influência é o jovem Agustín Almendra. Utilizado como um meia interior pela esquerda da linha de três, estabelece apoios de qualidade como primeira opção de passe. Junto a isso, cumpre papel fundamental nas triangulações executadas pelos lados do terreno, jogada bastante característica deste Boca Juniors com o comando de Battaglia. E assim como Almendra aparece pelo lado canhoto, Rodrigo Montes costuma repetir tal função pelo lado direito.

Almendra (21 anos) em situação de apoio na saída de bola, oferecendo opção junto a Fabra (com a bola) e Cardona

Neste cenário de construção ofensiva, a amplitude oferecida pela dupla de laterais ganha importância. Apesar de surgirem com movimentos por dentro em triangulações curtas em alguns momentos, a principal responsabilidade dos homens de lado é alargar o bloco defensivo adversário, jogando em profundidade no campo de ataque e com ambos partindo à frente ao mesmo tempo, já que há a presença de um meio-campista de maior poder de marcação para fazer essa compensação e não deixar o time tão exposto.

Weigandt (lateral-direito) e Fabra (lateral-esquerdo) ocupando seus corredores em campo adiantado simultaneamente

Mais adiante, o trio ofensivo geralmente formado por Cardona, Pavón e Luís Vázquez oferece uma boa dinâmica perto do terço final para explorar os espaços e gerar boas ocasiões para finalizar. Destes, o único que costuma ter seu posicionamento inicial variando é Pavón. Por vezes, surge mais ao lado de Cardona, jogando atrás do centroavante. Em outras situações, aparece como um segundo atacante. Porém, sua movimentação não muda tanto. Apesar de ter liberdade para associar e flutuar nos 30 metros finais do campo, o lado direito é onde mais costuma aparecer para produzir.

O mapa de calor de Pavón na temporada 2021: presença constante no lado direito do campo

Se Pavón tem presença mais constante pela direita, Cardona cai um pouco mais pelo lado esquerdo. Como o Boca Juniors usa bastante os lados do terreno para ir à frente, como destacado anteriormente, esta presença próxima à lateral acaba sendo importante. E tal movimento também lhe dá a possibilidade de finalização de média e longa distância com seu pé direito cortando para dentro. Entretanto, boa parte de sua atribuição passa por se posicionar na entrelinha, criar apoios no campo de ataque para articular as jogadas e buscar associações em toda a zona entre o circulo central e a grande área rival, como um clássico enganche.

Um bom exemplo do posicionamento de Cardona buscando a entrelinha, em jogo contra o Atlético Tucumán

No comando de ataque, Vázquez e Orsini revezam boa parte das presenças entre os titulares, com o primeiro recebendo a maioria das oportunidades até o momento nesta lógica de dar espaço aos atletas formados em casa. Independente de quem jogue, a missão de oferecer profundidade, fixar a linha de defesa rival e buscar movimentos às costas da zaga para receber com liberdade é a mesma. Além disto, ambos – na faixa dos 1.90m de altura – oferecem ameaça constante no jogo aéreo, buscando sempre o posicionamento central ou na segunda trave para receber os cruzamentos.

No jogo contra o Lanús, Orsini foi o atacante de referência e jogador de maior profundidade na equipe xeneize

Ideias bem desenhadas e já sendo aplicadas com um bom retorno não significam uma obra terminada. Muito pelo contrário. O Boca Juniors ainda tem pontos a evoluir e a acrescentar como alternativas, sobretudo no aspecto individual. O meia Eduardo Salvio, por exemplo, é um que pode dar novas camadas ao time. Fora de ação desde o último mês de fevereiro, quando lesionou os ligamentos do joelho contra o Sarmiento, vinha se notabilizando por ser o centro criativo azul y oro. Com seus passes mortais e uma visão apuradíssima, tem tudo para tornar o time mais objetivo na frente, agora que se aproxima de um retorno.

Ainda, os jovens Aaron Molinas (21) e Cristian Medina (19) começam a receber oportunidades, pintando como opções recorrentes saindo do banco ou até mesmo partindo como titulares no meio-campo em alguns compromissos. De qualquer maneira, fica para o torcedor xeneize até aqui uma sensação muito melhor na comparação com o que era visto em campo no primeiro semestre, alimentando expectativas mais esperançosas para a próxima temporada.

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