As primeiras impressões de Pia Sundhage
A nova comandante da Seleção Brasileira feminina de futebol contou com uma semana de trabalho e dois jogos, onde estreou com goleada para cima da Argentina e empatou sem gols com o Chile, perdendo na disputa de pênaltis e assim ficando com o vice-campeonato do Torneio Uber. Para além de título ou vitórias buscamos analisar […]
A nova comandante da Seleção Brasileira feminina de futebol contou com uma semana de trabalho e dois jogos, onde estreou com goleada para cima da Argentina e empatou sem gols com o Chile, perdendo na disputa de pênaltis e assim ficando com o vice-campeonato do Torneio Uber. Para além de título ou vitórias buscamos analisar as primeiras mudanças de Pia Sundhage no modelo de jogo brasileiro e encontramos alguns mecanismos interessantes e que divergem dos anteriores utilizados por Vadão. É pouco para qualquer tipo de conclusão, obviamente, mas o desempenho foi animador, principalmente pelas mudanças significativas com praticamente a mesma lista de convocação da Copa do Mundo na França.
Anteriormente montamos um ‘’Dossiê Pia’’ ilustrando as ideias de jogo da treinadora na Seleção da Suécia nos anos de 2016 e 2017, encontramos algumas dessas características em mecanismos do time brasileiro e indicamos a leitura antes desse texto.
Em linhas gerais, defensivamente o comportamento do Brasil não é mais o mesmo. Com Vadão a equipe priorizava marcar por encaixe no setor, tendo sua adversária como principal referência (a famosa dança de pares). Pia começa a dar indícios que sua referência vai passar a ser por zona, com perseguições bem mais curtas e mais preocupação com os espaços:
Observe outro exemplo:
Esse tipo de marcação permitiu com que o Brasil se mantivesse mais organizado e com linhas mais próximas – compactação defensiva – facilitando ações de cobertura, principalmente quando alguém desgarra de sua linha (geralmente a lateral do lado da bola nas equipes de Pia Sundhage):
Pequenas mudanças que ofereceram menos espaços aos nossos adversários e que permitiram proteger melhor nossa área.
E aqui tem um ponto importante a ser citado: mesmo sendo oponentes ‘’mais fracos’’ foi interessante observar essas alterações de comportamento e aplicação de conceitos táticos, que significativamente contribuíram para uma pequena melhora de desempenho no mesmo plantel que participou da Copa do Mundo ou de convocações anteriores. A fala da zagueira Erika, para as Dibradoras, demonstra a preocupação com os detalhes: Pia comparou a capacidade de um melhor posicionamento corporal defensivo à nossa capacidade de sambar. Ela não quer uma abordagem de frente, quer as jogadoras de lado para estar aptas a conceitos de bola descoberta (não estou pressionando quem tem a bola) e coberta (estou pressionando o portador da bola), por exemplo.
Ofensivamente, em ambos os jogos, Pia Sundhage distribuiu nossas jogadoras em duas tradicionais linhas de quatro, mais duas atacantes à frente, o famoso 1442. A sueca priorizou a saída de bola desde a base da jogada (seu campo defensivo) e com muito apoio das volantes por dentro, assim como fez com a Suécia durante a EURO de 2017 – podemos chamar essa saída de 4-2, pois participam todas as jogadoras da última linha de quatro mais as duas volantes, como supracitamos.
Essa posse de bola buscava ser mais objetiva e menos afobada, com mais circulação, na tentativa de ir avançando pelo campo sempre com apoios e muita mobilidade das atletas, trocas posicionais, ocupação de espaços vazios, concentrando o jogo pelas laterais. Mesmo com menos distância entre os setores ainda não se viu o Brasil construindo suas jogadas pelo meio-campo, que Pia considera importante em suas equipes, mas isso se explica pelo pouco tempo de trabalho somados aos padrões deixados pela era Vadão.
Todos esses conceitos foram importantes, principalmente para a construção do primeiro gol diante da Argentina, como mostra o vídeo abaixo:
E mesmo contra o Chile, com uma equipe com 7 mudanças, as ideias ainda estavam presentes – trocam as peças, não as ideias e aplicação dos princípios:
Ainda falando do ataque brasileiro, três comportamentos podem ser apontados: a importância de Andressa Alves nas bolas paradas, o posicionamento de Erika vindo de trás para atacar a bola nos escanteios e o fato de ter sempre pelo menos duas jogadoras brasileiras pisando na área para cruzamentos ou jogadas de linhas de fundo – comportamentos muito treinador por Pia nessa primeira semana de contato e que também foi característico na Seleção Sueca. O gol de Debinha traduz bem esse momento:
Novamente contra o Chile e com mais possibilidades de bolas longas, a mesma intenção presente:
Ainda sobre Andressa Alves vale destacar sua liberdade para se movimentar em campo, prioritariamente ocupando os corredores laterais, mas com possibilidades de flutuar pelo centro de campo, lembrando um pouco das ações de Allasni na Suécia.
Em transição ofensiva não se viu muita alteração de comportamento: a ideia é trocar passes na tentativa de progredir, porém não mais de maneira demasiada. Além da aproximação de jogadoras perto de quem recuperou a bola, também se viu uma Seleção com mais passes para trás quando não havia oportunidade de progressão. Já quando perdemos a posse ainda há o mesmo problema: a mudança de comportamento ainda é muito mais individual do que coletivo. Umas procuram pressionar, outras não e este vem sendo um dos assuntos citados por Pia para trabalhar na busca de organizar esses poucos segundos após a perda da bola.
A execução de toda teoria que citamos é o fator animador até aqui. Com pouco tempo de treinamento Pia Sundhage vai começando a pincelar suas ideias dando uma nova face a nossa Seleção. Seu próximo desafio será no dia 5 de outubro em um amistoso contra a forte Seleção da Inglaterra.
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