CARROSSEL DE TÉCNICOS
Por Jonatan Cavalcante O calendário do futebol brasileiro é constantemente criticado devido ao número excessivo de jogos, pouco tempo para treinar, recuperar atletas e implementar ideias de jogo mais complexas, o que reflete diretamente na qualidade do jogo que chega até os fãs do esporte. Em um ambiente que muita das vezes não favorece a consolidação […]
O calendário do futebol brasileiro é constantemente criticado devido ao número excessivo de jogos, pouco tempo para treinar, recuperar atletas e implementar ideias de jogo mais complexas, o que reflete diretamente na qualidade do jogo que chega até os fãs do esporte. Em um ambiente que muita das vezes não favorece a consolidação de ideias, o desempenho oscila e os resultados se tornam mais imprevisíveis que o normal. E em um cenário de pressões externas e internas, o técnico é o primeiro a ser questionado e demitido. Em virtude dessa cultura pautada nos resultados, o índice de demissões entre as 20 equipes que disputam o Campeonato Brasileiro da Série A ao longo das últimas 5 temporadas (2014-2018*) é alarmante. Ao todo 261 técnicos foram contratados. Uma média de 2,6 treinadores por clube/temporada.
*temporada em andamento
O alto índice de turnover (troca de pessoal), seja ele por falta de resultados, falta de convicção no trabalho, inexistência de alinhamento das ideias do treinador com as características do elenco, má gestão de grupo ou por proposta de outro clube, proporcionam que o carrossel nunca pare de girar! Restando 5 rodadas para o fim da atual temporada, até o momento, um total de 55 técnicos comandaram as equipes que disputam a elite. As 33 trocas de comando técnico indicam uma preocupação exacerbada com o alcance dos objetivos, mas que não respeitam processos. O Campeonato Brasileiro possui significativa contribuição para a continuidade do carrossel. No período entre 2014 e 2018, um total de 230 técnicos passaram pelas equipes. Representando uma parcela de 88% das contratações e demissões de treinadores em toda a temporada.
Técnicos por temporada no Brasil
Considerando apenas os clubes participantes da Série A do Brasileiro nas últimas 5 edições, foi constatada alta rotação de técnicos ao longo das competições disputadas no ano. Apesar de ter os menores índices nas contratações de técnicos, no ano de 2014 apenas Corinthians, Cruzeiro, Internacional e São Paulo não trocaram de técnicos na temporada. E mesmo com Corinthians e São Paulo não tendo um bom desempenho no Estadual, as gestões dos clubes tiveram convicção nos trabalhos realizados por Mano Menezes e Muricy Ramalho e a manutenção resultou na classificação dos times paulistas à Copa Libertadores. Cruzeiro e Internacional conquistaram os respectivos campeonatos estaduais e também fizeram ótima campanha no Brasileiro. A Raposa foi campeã e o Colorado alcançou a terceira colocação e também se classificou para a Libertadores 2015.
A temporada de 2015 no Brasil foi marcada pela maior média de técnicos por clube nas últimas 5 temporadas: 2,9 técnico por clube. Ao todo, 58 técnicos comandaram alguma das 19 equipes da Série A. A única exceção à regra foi o Corinthians que manteve Tite durante todo calendário esportivo. Vale ressaltar que o início da temporada corintiana não foi exitoso. Com Tite reassumindo a equipe pós-período sabático, os jogadores levaram algum tempo para assimilarem os conceitos introduzidos pelo técnico – o que é totalmente natural. Com o primeiro quadrimestre oscilante, o time foi eliminado nas semi-finais do Campeonato Paulista, conseguiu a 4º melhor campanha na fase de grupos da Copa Libertadores, mas foi eliminado pelo Guaraní-PAR. A manutenção do técnico e o amadurecimento das ideias pelo elenco fez com que o Corinthians conquistasse o título da Série A. No contraponto, Goiás (5), Atlético-PR, Flamengo, Fluminense e São Paulo (4), foram as equipes que mais tiveram treinadores na temporada. O Goiás foi rebaixado, Flamengo e Fluminense conviveram com o fantasma do rebaixamento até os últimos jogos e o São Paulo foi o ponto fora da curva, ao conseguir uma vaga na Libertadores. Em 2016, mais do mesmo. Novamente apenas uma equipe manteve o técnico por toda temporada: Santos. Dorival Jr iniciou a temporada e teve tempo para montar o elenco e introduzir as suas ideias de jogo. O Peixe conquistou o Campeonato Paulista, chegou às quartas de final da Copa do Brasil e foi vice-campeão Brasileiro, voltando a Libertadores após 4 anos sem participação no torneio. O título do Brasileiro ficou com o Palmeiras que teve dois técnicos no ano (Marcelo Oliveira e Cuca), uma rara exceção na história recente da competição.
O ano de 2017, apesar de mais uma vez apresentar alto número de turnovers, foi o qual obteve-se o maior número de manutenção de técnicos por temporada. Foram 6 clubes (Avaí, Botafogo, Corinthians, Cruzeiro, Fluminense e Grêmio) que oportunizaram e deram garantias para que os respectivos técnicos iniciassem e terminassem os trabalhos. Dos seis clubes que optaram pela manutenção, 3 ficaram entre os cinco primeiros, que teve o Corinthians como campeão do Brasileiro. Considerando os 14 times restantes, constatou-se uma média 3 técnicos por ano. Nesta temporada, apenas, Cruzeiro, Grêmio e Internacional não trocaram o comando técnico. Além disso, 2018 aparece como a 3º maior média de técnicos nas últimas 5 edições.
“Receituário” campeão
O futebol não é uma receita de bolo que apresenta formas fixas de buscar respostas e soluções. O futebol a todo momento interage com o ambiente interno e externo e é muito suscetível a mudanças. Porém, não se pode ignorar os padrões que são descobertos. Realizando um recorte no Campeonato Brasileiro no período de 2006 até 2017, constatou-se que os clubes que mantêm o técnico, aliado a outros fatores possuem grandes chances de conquistar o título. No período em vigência, observa-se que 3 em cada quatro clubes campeões brasileiros mantiveram o técnico durante toda a temporada. Apenas em 3 oportunidades, clubes que trocaram de técnico conseguiram ter êxito. Os dados reforçam que a não precipitação por resultados no curto prazo, a preocupação com os meios para se chegar ao objetivo traçado e a oportunização da continuidade do trabalho são escolhas que aumentam as possibilidades de ganhos esportivos.
“Receituário” rebaixado
Se para ser campeão a estatística apresenta como tendência a manutenção do técnico – dentre outros fatores – , a constante rotação de profissionais (turnover) acoplados com outros elementos tornam o clube mais propenso ao descenso. A média de treinadores por equipes que foram rebaixadas é de 3 por temporada. Ou seja, um técnico a cada 4 meses. Tempo insuficiente para estabelecer hábitos, comportamentos, conhecer os jogadores e suas características e consolidar ideias de jogo.
Ciclo de vida útil dos comandantes
Considerando apenas os clubes que estiveram presentes consecutivamente nas edições do Campeonato Brasileiro no período de 2014-2018, foram contratados 143 técnicos em 4 anos e 11 meses. O G-12 totalizou uma média de 28,6 técnicos/temporada. Ou seja, cada clube contrata em média 2 técnicos por temporada. Entretanto, alguns clubes possuem média de turnover superior a essa, como é o caso do Sport que é de 3 técnicos/temporada, resultando em uma média de um técnico a cada 4 meses. Esses dados, ratificam que o ciclo de vida útil de um técnico nos clubes brasileiros é curto. Não há o percorrimento natural das fases laborais – introdução, crescimento, maturidade e declínio – pois o tempo médio que cada técnico possui atrelada a quase sempre necessidade por resultados, gerando queimas de etapas e resultando na não passagem pelas fases de crescimento e maturidade. Ou seja, a maioria dos trabalhos dos técnicos apenas são introduzidos e atingem o declínio rapidamente.
Remando contra essa maré estão Grêmio, Corinthians e Cruzeiro. Os clubes possuem os melhores indicadores no quesito técnicos por temporada. O time paulista e o mineiro mantiveram os técnicos por toda a temporada em 3 oportunidades, já o Grêmio em outras duas. E o reflexo foi sentindo no desempenho do time e consequentemente nos ganhos esportivos. Corinthians conquistou 2 Campeonatos Brasileiros, Grêmio venceu a Copa do Brasil e Libertadores e o Cruzeiro também conquistou a Copa do Brasil.
Comparando com o resto do mundo
Mudança de status quo
Com médias de técnicos por temporada superior as principais ligas sul-americanas e européias, a Federação Brasileira de Técnicos de Futebol (FBTF), em reunião com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), propôs que haja o limite de duas transferências de comando por clube em cada série do Campeonato Brasileiro e na Copa do Brasil. Ou seja, cada equipe poderá ter três treinadores. Além disso, cada técnico pode comandar no máximo dois times.
O fato é que o carrossel nunca para de girar! Entretanto, existem medidas para atenuar a maneira desmedida e leviana como é feita a troca de treinadores. Os gestores dos clubes precisam buscar conhecimento e capacitação para obter um embasamento teórico e consequentemente realizar uma análise coerente e assertiva sobre o trabalho dos técnicos.
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