O QUE DIZEM AS PRANCHETAS
Por @BolivarSilveira Os duelos táticos ganham cada vez mais espaço na pauta dos torcedores e do mainstream. Mas afinal o que é a tática? E o que ela realmente representa dentro de campo? Segundo o dicionário Aurélio, tática tem o seguinte significado “Arte de combinar a ação de tropas, ou os recursos característicos das diferentes armas, […]
Por @BolivarSilveira
Os duelos táticos ganham cada vez mais espaço na pauta dos torcedores e do mainstream. Mas afinal o que é a tática? E o que ela realmente representa dentro de campo? Segundo o dicionário Aurélio, tática tem o seguinte significado “Arte de combinar a ação de tropas, ou os recursos característicos das diferentes armas, a fim de obter o máximo de eficácia no combate. Conjunto de meios ou recursos empregados para alcançar um resultado favorável”. Claramente o dicionário aborda a palavra para um contexto bélico, de guerra; e no futebol não é muito diferente. O treinador pensa e posta sua equipe para vencer as fraquezas do adversário e potencializar as suas virtudes em nome da glória.
Baseado neste pensamento buscamos trazer os esquemas que estão sendo utilizados nas grandes ligas pelo mundo. Muitas ligas intercambiam ideias de jogo, o jogar é cada vez mais globalizado e não fica fechado nas antigas “escolas”. A Premier League já não é somente kick-and-rush, a Itália não vive apenas do catenaccio e não há mais enganche de calção limpo nos potreiros argentinos. Lembremos também que a Copa do Mundo está chegando e os campeonatos nacionais geralmente oferecem grandes spoilers.
Antes de entrarmos na paisagem tática de cada liga, é bom deixarmos claros alguns aspectos. Todo esquema tático possui variações dentro do mesmo modelo, pois depende de circunstâncias físicas e técnicas de cada jogador. O desenvolvimento tático e as mudanças de esquema podem variar de acordo com o adversário, e por essa razão o desenvolvimento necessita ser mútuo entre as equipes. Basta refletirmos sobre o crescimento da ideia de futebol desde o seu princípio; o W-M foi trocado pelo 4-2-4, pela superioridade que esse gerava nos dois extremos do campo, e este trocado pelo 4-3-3 para ganhar o meio campo (superioridade no setor) e assim por diante. O que quero dizer é que esquemas são inovadores de acordo com a conjuntura tática que ele se encontra em determinado momento.
Considerando esses aspectos de extrema importância, vamos observar as inovações e modas do futebol pelas grandes ligas.
INGLATERRA
Na Terra da Rainha e do chá das cinco, temos a pomposa e glamorosa Premier League com seus milhões de libras buscando jogadores e treinadores por toda a parte do globo. Pelo que parece esse investimento vem dando resultado dentro de campo, de taças continentais nem tanto, e sim em diversidade tática e de maneiras de atuar. A homogeneidade do viril kick-and-rush já ficou para trás e agora vemos uma grande diversidade nas ideias de jogo.
Dentre os 20 times da liga, existem 9 sistemas táticos. Demonstrando a heterogeneidade do futebol na Inglaterra. O 3-4-2-1 é o sistema favorito, sendo utilizado por sete equipes. Claramente influenciados por Antonio Conte com sua linha de três e seus alas atléticos como falamos aqui. Porém o esquema com mais times na parte de cima da tabela é o 4-2-3-1, liderado por ninguém menos que José Mourinho.
Coincidência ou não (provavelmente sim), os dois sistemas de maior aceitação nos gramados da Premier League são os utilizados por Gareth Southgate na Seleção Inglesa. O que obviamente facilita a adaptação dos jogadores locais quando convocados, por já estarem habituados às suas funções e localizações em campo.
ITÁLIA
Ao que tudo indica as retrancas italianas ficaram no passado. Pelo menos é o que Sarri, Spaletti, Di Francesco e Alegri tentam realizar. Aos poucos o futebol italiano vai voltando ao patamar que alcançou nos anos 90. Diferente do que muitos pensam, a Série A nos apresenta diferentes modelos e sistemas táticos.
Atualmente o 4-3-3 é o que mais possui adeptos, entre eles Roma, Napoli e Milan. É bom lembrar que todos atuam com pontas de pé trocado, buscando sempre a diagonal e a ultrapassagem de algum jogador pela linha de fundo. Com apenas 5% a menos o 4-2-3-1 também é bastante atraente em solo italiano.
A Seleção Italiana, diferente do que se joga no país, atua no 4-2-4, esquema que se quer é utilizado na liga nacional. Com certeza dificultando a adaptabilidade dos convocados, já que apenas 3 deles atuam fora do país – e os que jogam em outros centros também não atuam no 4-2-4.
ESPANHA
O território espanhol já foi palco de diversas revoluções no futebol. Viu a seleção brasileira de 1982, o Barcelona de Cruyff e o futebol associativo de Pep Guardiola. Os olhos do mundo sempre estão voltados para lá. Aliás, é onde atuam as duas maiores estrelas do futebol mundial, portanto não tem como ser diferente. Atualmente dois underdogs vêm conquistando espaço e conhecimento nas casamatas espanholas: Quique Sétien e Marcelino Toral. Mas esses dois precisam de um artigo inteiro, então deixemos para depois.
Três sistemas predominam na Espanha: O 4-2-3-1, presente com força em todas as ligas, tendo 30%. O 4-3-3 é o sistema utilizado por Real Madrid e Barcelona, porém com dinâmicas muito diferentes: o Real Madrid utiliza pontas invertidos e um centroavante referência, que em alguns momentos busca o lado do campo, deixando a criação para os volantes. Já o Barcelona vem atuando com Messi de falso 9, explorando muito o entrelinha adversária e abrindo espaço para infiltração dos jogadores que vêm de trás. Porém, nenhum destes dois esquemas é o favorito na liga espanhola, e sim o 4-4-2, com variações de quadrado ou losango no meio campo.
Para La Fúria, Lopetegui utiliza o 4-3-3 dos dois gigantes. Escolha inteligente, já que a maioria dos convocados para a renovação da seleção pertencem ao Real Madrid e Barcelona e terão fácil assimilação das ideias de jogo.
ALEMANHA
Atrás apenas da Premier League em crescimento de verba e transmissão nos últimos 20 anos a Bundesliga vai ganhando novos apaixonados ao redor do mundo. A Alemanha nunca gerou tanto novos talentos no futebol, sendo jogadores e técnicos. Há de se destacar o trabalho da Federação Alemã de Futebol (DFB) na implementação de metodologias para aperfeiçoamento e formação de profissionais do futebol. Muito se deve à parceria com a Double Pass, empresa que avalia e otimiza jogadores e treinadores.
As mudanças no futebol alemão ficam evidentes ao analisarmos o gráfico e compararmos empiricamente com o monótono e homogêneo futebol alemão de anos atrás.
O 3-4-2-1, com a linha de três e os alas atléticos que se tornaram epidemia na Inglaterra, ganham bastante coro em solo Alemão e empatam em número de adeptos com o 4-2-3-1, sistema bastante utilizado em todas as ligas. O cenário tático alemão é bem próximo ao Inglês, uma salada de frutas tática e dois esquemas que despontam como favoritos.
Ao analisar a seleção alemã e tentar enquadrar a forma de jogar da equipe em uma caixinha cartesiana tivemos extrema dificuldade, então percebemos a importância de tempo de trabalho e o verdadeiro significado de fluidez no futebol. Durante os jogos analisados os selecionados por Löw atuaram com linha de 5, linha de 3 e linha de 4. Jogaram com centroavante e falso 9. O diagnóstico é fácil: com ideias e tempo de trabalho qualquer projeto fica mais fácil de ser executado. Seja ele utilizando a mesma plataforma da liga nacional ou não.
FRANÇA
A liga francesa sempre sofreu preconceito de boa parte dos amantes do futebol. Diferentemente da seleção nacional, o campeonato da França era escanteado e visto como de segundo patamar na Europa. Aos poucos esse status começa a mudar, graças a grandes investimentos de petrodólares e ótima prospecção de jovens talentos. A Ligue 1 hoje é a melhor porta de entrada para o continente europeu e ainda conta com as duas maiores promessas para Bola de Ouro em um futuro próximo: Neymar e Mbappe.
Contam com Unay Emeri, multicampeão pelo Sevilla; Ranieri, dono de uma campanha irretocável pelo Leicester; Leonardo Jardim, semifinalista da última Champions. e Marcelo Bielsa, referência para tantos treinadores. Vejamos como fica o gráfico dos esquemas táticos utilizados:
0 4-2-3-1 presente em várias ligas de forma massiva é o grande escolhido do campeonato francês. Entretanto, as equipes que o utilizam estão no meio de tabela. Enquanto o segundo colocado 4-4-2, que também conta com uma representatividade considerada, é o esquema que possui maior número de times na parte de cima da classificação. É o sistema utilizado por Leonardo Jardim e Claudio Ranieri, que gostam de ter suas duas linhas de 4 bem próximas, balançando junto com adversário e fechando qualquer espaço possível
Deschamps, treinador dos Les Bleus, gosta de utilizar o 4-4-2. Sistema de melhor resultado na liga francesa, o 4-3-3 utilizado pelo Paris Saint Germain também é do agrado do treinador.
BRASIL
“Somos pentacampeões sem estudo”. É assim que alguns bradam para justificar a falta de conhecimento científico no futebol brasileiro. Resposta rasa e sem fundamento para explicar o inexplicável. Atualmente o futebol tupiniquim é comandado por um procurado da Interpol. Há não muito tempo era dirigido por José Maria Marin, dirigente com forte ligação com a ditadura militar e que hoje está preso nos Estados Unidos. É com este resumo necessário que apresento o gráfico tático no Brasil.
A falta de ideia resulta nesta homogeneidade tática, enquanto o estudo do futebol for levado como brincadeira, papo de “jornalista de videogame”, infelizmente o cenário será este. É necessário um futebol levado a sério no Brasil; país que importa milhares de jogadores para o exterior e tem um potencial enorme para produzir craques. O potencial de crescimento é enorme se levarmo-nos a sério.
O 4-2-3-1 é o esquema da moda no Brasil. Caracterizando-se quase sempre por um volante construtor e outro destruidor. Dois pontas, um meia-atacante de criação e um centroavante. Em todos os sistemas há passagem dos laterais, que possuem papel determinante no modelo brasileiro de futebol.
Pela seleção brasileira, Tite utiliza o 4-1-4-1, sistema que implantou no Corinthians com boa parte dos jogadores que hoje são uma espécie de coluna vertebral do Brasil. Escolha acertada, que facilitou a adaptação e explica os bons resultados rapidamente. É necessário destacar que o 4-1-4-1, sistema mais utilizado na Copa de 2014, atualmente não possui muita representatividade nas grandes ligas mundiais.
ARGENTINA
A Associação de Futebol Argentino(AFA), apesar de seus problemas com justiça, implementou o ótimo programa da Associação de Treinadores do Futebol Argentino(ATFA). Esse programa funciona como uma faculdade para quem quer trabalhar com futebol em solo argentino e é obrigatório. Então para comandar qualquer clube federado é necessário ter conhecimento científico. A ATFA já colhe frutos dentro e fora do seu território, dezenas de seus ex-alunos hoje comandam equipes renomadas no exterior, como Pochettino, Berizzo, Tata Martino, Pellegrino, Matias Almeyda, La Volpe e etc. O estudo fica evidente quando analisamos o gráfico de sistemas táticos no campeonato nacional, fica evidente o conhecimento técnico e a busca por inovação.
A mescla de ideias e conceitos de futebol ficam bastante evidentes neste gráfico. A predominância da escolha pende para o 4-4-2, formato em que geralmente atuam os times mais defensivos, com bem treinadas linhas de 4. São eles Colón, Patronato, Tucumán e Vélez. O 4-3-3-, segunda colocado no índice dos sistemas, é utilizado predominantemente por times mais soltos e verticais, como Boca, Chaca, Talleres e Argentinos Juniors.
É importante diagnosticar que a Superliga argentina é a única que apresenta equipes que atuam com linha de 3, 4 e 5 defensivamente. Claro que há equipes de outros países que variam suas dinâmicas de acordo com o contexto do jogo e podem apresentar esse mesmo molde.
Dentro desse contexto de estudo que é aplicado pela ATFA, existe a bagunça e mistura de futebol com política que é imposta pela AFA, que no momento corre sério risco de ficar fora do mundial. Pelos dois primeiros jogos oficiais, Sampaoli optou pelo 3-4-2-1 e montou uma linha titular com jogadores de muitas equipes diferentes. Assim a adaptação ao modelo imposto ficou muito difícil. Acredito que futuramente Sampaoli teste um novo esquema e busque uma coluna de time já entrosada. Adaptação e entendimento de equipe são chaves fundamentais para qualquer seleção de futebol.
* Todos os dados citados foram realizados pela Opta Sports e cedidos ao site Whoscored.com
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