Projeto Atalanta: um case de sucesso na Europa
Chamando atenção pelos feitos dentro de campo, o projeto da Atalanta vai muito além disso
A Atalanta é a queridinha da temporada 19-20 no futebol por coisas feitas dentro de campo. Quartas de final na Champions League, quarto lugar na Serie A com um ataque de 70 gols e um time bom de assistir em um modelo não usual ultimamente. Mas o projeto fora de campo é tão encantador quanto. Baseado no histórico trabalho de base que revelou Scirea, em Donadoni – uma bandeira do Milan – e um centro de observação acima da média em âmbito italiano, o clube esqueceu dos três rebaixamentos no século e caminha a passos largos para ser o projeto mais sustentável da Itália.
Antonio Percassi, presidente do clube que assumiu em 1990, deixou uma semente: trouxe Fermo Favini, a missão de devolver o selo formador da Atalanta. Percassi saiu em 1994 e voltou em 2010 com a Dea rebaixada. O clube era descredibilizado por manipulação de resultados, que chegou a ter Cristiano Doni, capitão da equipe, em prisão domiciliar. Era o pior momento no cenário italiano. Mas a base continuava a formar.
A base formadora da Atalanta
Kessie, Conte, Caldara, Gagliardini e Bastoni foram formados em casa e fizeram a Atalanta lucrar €102 milhões. Uma cifra inimaginável no futebol italiano. A liga tem como padrão utilizar jogadores de mais idade. O “formar para vender” é inteligente, o clube vende jogadores que nem jogaram no principal por um bom preço. O último caso foi Dejan Kulusevski que chegou para o sub-17, foi emprestado para o Parma e a Juventus pagou €35 milhões. Cristante e Mancini, que chegaram para a base de Bérgamo, podem render €43 milhões. É a potencialização do “jogo feito em casa” do clube, com rendimentos esportivos e vendas a curto prazo.
A Atalanta é um dos clubes que mais forma na Itália, tem o selo de melhor base do país dado pela FIGC (Federazione Italiana Giuoco Calcio). Tudo isso em uma cidade com 120 mil habitantes. É um case de sucesso. E a base não é só caso de sucesso financeiro. Esportivamente, a Atalanta ganhou 17 títulos nacionais de 1991 a 2014. Os jovens chegam no clube aos seis ou sete anos de idade e começam a treinar com bandeiras do clube, como Bepe Bergomi e Walter Bonacina.
O scout do clube é, em sua maioria, acertado. A Atalanta não é o clube com o melhor patrocínio, não tem dinheiro do petróleo ou de qualquer investidor estrangeiro, prática crescente na Itália, e também não tem a maior das arrecadações por receita de TV. O jeito é observar o mercado e atirar certo. E a Atalanta, nos últimos anos, vem sendo o sniper do mercado italiano. Sem ser a história do Football Manager (que aposta em jovens), busca jogadores de idade mesclada para compor o elenco. A média é de 26,8 anos de idade.
O clube usa muitas oportunidades no mercado; observa as grandes ligas e as periféricas como da Bélgica, Holanda, Ucrânia e a América Latina. Com isso, consegue mapear jogadores que não renderam seu máximo na elite da elite e antecipa o mercado buscando os jovens em ligas menores por preço baixo e bom preço de revenda. Gollini, goleiro que chegou a ser cotado para a Azzurra, foi mal no Aston Villa e hoje é um dos pilares da equipe de Gasperini.
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Indo direto para o ataque, Papu e Ilicic, chegaram ao clube em baixa. O primeiro, que jogou muito pelo Catania, veio da Ucrânia em um momento em que muitos clubes não apostariam no jogador: perto com mais de 25 anos, pouca minutagem em liga menor e sem o estofo. Comprado por somente €4 milhões. Em 223 jogos, impressionantes 53 gols e 60 assistências. Hoje, aos 32, vive seu auge. Não só técnico, o capitão da Atalanta muda a mentalidade do time como um todo. Ilicic, com oscilações por Fiorentina e Palermo, é outro.
O “Messi de Bérgamo” é o alto nível técnico do clube. Chegou em 17-18, tem 49 gols em 106 jogos. A contratação, após os 30 anos, foi por €5 milhões. Outro que mudou o patamar técnico em idade mais avançada. Clubes, em sua maioria deixariam passar. Gasperini; como um lapidador de talento que outrora elevou o nível de Diego Milito, cuidou da dupla e fez explodir de vez.
Com um sistema focado em jogadores mais físicos atrás de ambos que deixam os dois descansando. E existem mais exemplos de jogadores potencializados no modelo atual. Tolói, Hateboer, De Roon e Gosens são outros jogadores desde que chegaram na Atalanta. O sistema é agressivo, tem uma linha de jogadores: altos, intensos e capazes de percorrerem grandes distâncias por noventa minutos. E em nenhum desses o clube gastou mais de €20 milhões. A Atalanta, hoje, gasta menos em salários do que toda a Premier League.
O próximo passo vem sendo dado no mercado: Malinovski, que vem entrando aos poucos, já deixou 4 gols na Série A. O ucraniano veio de outra liga menor, mas é um dos jogadores de profundidade no elenco. Duvan Zapata, depois de temporadas em Sampdoria e Napoli, é um ótimo backup para Gasperini tirar do banco e colocar quando precisar e quiser. A Atalanta é, antes de mais nada, potencialização de talentos. Jogador por jogador, todos “feito a mão” por Gasperini. O treinador é um estrategista, mas lapida. O sistema de observação caminha de mãos dadas com o que acontece em campo. E assim a Atalanta se torna o projeto mais sustentável da Itália. E seu clube, quando entrará nesse método?
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