River Plate: para confirmar a dinastia

Em mais uma final de Libertadores, os argentinos buscam seu terceiro troféu de Libertadores nas últimas cinco edições para coroar de vez o trabalho de Marcelo Gallardo

Quatro semifinais em cinco temporadas. Três finais desde 2015. Dois títulos até o momento. E agora, em 2019, a possibilidade da terceira taça neste período. Desde que Marcelo Gallardo assumiu o River Plate, a equipe vem tomando conta do cenário sul-americano de maneira hegemônica. Neste final de semana, contra o Flamengo, um novo desafio espera os millonarios.

Apesar de já ter vivido a experiência de disputar uma final em campo neutro no ano passado, na volta contra o Boca Juniors, a tarefa em 2019 não dá margem para erros. Pela primeira vez, a Libertadores será disputada em final única, exigindo aplicação e concentração ainda maiores.

A decisão chega para o River como o ápice de sua escalada de desempenho dentro da competição. Iniciando com uma fase de grupos inconstante, os argentinos cresceram nas etapas de mata-mata e vão a Lima praticamente no meridiano da temporada de seu país, prestes a adentrar o 2º semestre do calendário e, em tese, com pernas mais frescas que o rubro-negro a essa altura. Com esta teórica vantagem, os tetracampeões irão atrás de mais uma taça tentando aplicar mais uma vez seu vitorioso modelo.

Uma base, intermináveis variações

Nesta dinastia millonaria sob o comando de Marcelo Gallardo, um esquema tático ficou consagrado: o 4-1-3-2. A ideia principal do treinador se baseia na presença de dois homens de frente alternando a movimentação fora da área e um jogador de meio posicionado atrás de uma linha de três, com o objetivo de qualificar a distribuição da bola desde a saída e oferecer equilíbrio defensivo para liberar a subida dos laterais.

Durante a Libertadores e boa parte de 2019, o setor defensivo do River Plate começou por Franco Armani na meta. Das 12 partidas da equipe na Libertadores, o camisa 1 iniciou 10 delas, obtendo o clean sheet em seis. À frente dele, Javier Pinola e Lucas Martínez Quarta formaram o miolo de zaga mais constante, sendo aparados pelos lados por Gonzalo Montiel pela direita e por Milton Casco pela esquerda, principalmente nos mata-matas. Na fase de grupos, com Casco se recuperando de lesão, Fabrizio Angileri ocupou a lateral canhota, mas não conseguiu aproveitar a oportunidade para se afirmar por ali.

No meio, Enzo Pérez figurou como o homem de confiança de Gallardo para abrir o setor, tomando o posto que era de Leo Ponzio. Logo adiante, o trio formado por Nacho Fernández, Exequiel Palacios e Nicolás De La Cruz vem se entendendo muito bem na criação das jogadas, alimentando o dueto ofensivo que costuma variar entre Lucas Pratto, Rafael Santos Borré e Matías Suárez.

Apesar do 4-1-3-2 ser a base do time pelas bandas do Monumental de Nuñez, o esquema pode ser variado sem maiores problemas. Nesta vitoriosa caminhada, Muñeco demonstra ser um treinador de “contraveneno”, adaptando e flexibilizando a formatação de acordo com o que o adversário apresenta de problemas a serem solucionados. A principal amostra disso aconteceu na fase inicial, contra o Inter em pleno Beira-Rio. Com o colorado vencendo por 2 a 1, fez duas trocas na volta do intervalo, alterou para o 3-4-3 e chegou ao empate, dominando o então time de Odair Hellmann. O repertório tático é uma das grandes forças deste River Plate, e tal alternância acontece com muita solidez em sua aplicação.

Imprevisibilidade, mas nem tanto

Ofensivamente, a parte argentina desta grande final da Libertadores se notabiliza por um ataque dinâmico e de movimentação incansável no campo de ataque, criando com isso várias possibilidades para agredir seu adversário ao valorizar a posse, mas sem perder a oportunidade de ser objetivo sempre que possível. Essa gama de alternativas, geradas a partir da alta mobilidade dos jogadores, constrói a impressão de que é difícil prever o comportamento do River com a bola, o que é, em parte, é possível concordar. Mas mesmo com isso, dá para traçar alguns padrões bastante fortes em relação ao comportamento millonario na hora de buscar o gol.

Tudo começa na saída de bola. Costumeiramente, Enzo Pérez recua entre os zagueiros ou joga o mais próximo possível deles para ajudar nos primeiros metros de campo, oferecendo superioridade numérica no setor e dando qualidade nos passes iniciais. Tal característica é mostrada nas estatísticas, visto que Pérez é o jogador com mais passes dados nesta Libertadores (771) e o 4º com mais passes por jogo em média (70).

Este movimento do camisa 24 desencadeia, por consequência, outro dos padrões visíveis no time de Gallardo: a subida dos laterais. Montiel e Casco executam papel vital no desenvolvimento ofensivo do River Plate, pois suas incursões ao campo adversário alargam a defesa adversária, além de dar profundidade pelos lados. Não é raro também vê-los, em alguns momentos, atacando por zonas mais centrais do campo, em situações de alternância de corredor com os meias mais abertos do 4-1-3-2.

Nos momentos ofensivos, Casco e Montiel são liberados para jogar em regiões mais altas do campo

O trio de intermediária, inclusive, é o responsável por entregar as pitadas de “imprevisibilidade”, cada um a sua maneira. Neste texto de meados de outubro, falei sobre Nacho Fernández e sua versatilidade no meio-campo. E de fato, sua movimentação por todo setor dificulta demais a marcação adversária ao buscar se aproximar sempre do setor da bola. Centralizado na linha, Exequiel Palacios é quem aparece mais fixo nas cercanias da área, aguardando o espaço surgir para buscar uma finalização. Se o jogo não se desenvolver, deixa o último terço e aparece perto da base da jogada, procurando a tabela curta e os movimentos de ruptura. Pela esquerda, Nicolás De La Cruz é o grande escape individual do River. É o atleta ofensivo com maior liberdade para conduzir, afinal, consegue fazer valer suas características de velocidade e drible sobre os rivais.

Complementando o sistema de Marcelo Gallardo, a dupla de ataque tem a sua importância na hora de tentar abrir os espaços para infiltrações de seus companheiros. Pratto e Borré, os dois homens de frente mais constantes da equipe, variam em quem sai da área para buscar jogo e quem espera a bola entre os zagueiros. Apesar de Pratto ser visto como um jogador mais pesado por muito, é ele quem surge associando mais como os meio-campistas, deixando o colombiano nos metros finais.

Uma ferramenta bastante utilizada pelo ataque do River é o pivô. A partida de ida contra o Boca Juniors, na semifinal, demonstrou bem a eficiência deste mecanismo. O segundo gol foi construído a partir de Matías Suárez sustentando a bola em cima de um dos zagueiros xeneizes, desmontando o encaixe da marcação, criando tempo e espaço para a chegada de Nacho Fernández até a área e, fazendo a tabela rápida, cruzou para a finalização do meia.

Contra o Boca, Suárez executa o pivô e abre o espaço para a finalização de Matías Suárez

Sem respiro

Se existe uma palavra capaz de caracterizar o trabalho defensivo do River Plate, essa palavra é incansável. Para Gallardo, pressionar o adversário o maior tempo possível em busca da recuperação da posse é imperativo dentro do modelo de jogo. Mas, claro, acima de tudo é necessário ter organização para isso, cuidando sempre para não deixar espaços às costas que possam ser explorados com bolas longas.

Logo que o rival assume o momento ofensivo, a missão millonaria é procurar os encaixes que estão mais próximos para sufocar o setor onde o lance do time contrário se desenrola. Independente da posição do atleta e da zona do campo, quem está por perto deve tentar a recuperação. Por exemplo, comum ver Casco e Montiel, os laterais da equipe, fazendo pressão em campo mais avançado.

Um exemplo da pressão do River após perder a bola. Contra o Cerro Porteño, 8 jogadores ocupam o campo adversário para reduzir espaços, organizados em um 2-3-3-2, com apenas os zagueiros na cobertura na metade defensiva

Ao se reorganizar, o River adota o 4-4-2 como formatação para defender as investidas opostas, mas sem recuar. A marcação com as linhas altas é invariável, procurando sempre o desarme no terreno ofensivo para percorrer menores distâncias com a bola em direção ao gol na sequência. Tanto que dos três principais líderes em desarmes dos argentinos na Libertadores, dois deles são meio-campistas: Nicolás De La Cruz (23) e Ignácio Fernández (22). Muito por conta disto, os números da dupla de zaga são bastante tímidos se forem comparados com outros atletas da posição ao longo do torneio.

Além disso, a precisão nas ações defensivas é um dos grandes pontos de força do River Plate. A equipe de Gallardo possui o 4º maior índice de acertos nos desarmes (90,6%) entre os 32 clubes que estiveram na competição desde a fase de grupos. E para encarar um ataque tão produtivo e potente como o do Flamengo, todos estes atributos precisarão estar a pleno na empreitada para levar a Glória Eterna pela quinta vez ao Monumental de Nuñez.

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