O novo coronavírus e o direito à saúde do jogador de futebol
Em meio a pandemia, o jogador tem direito à saúde, também. O que diz a lei? Como os clubes devem proceder?
Tão logo se confirmou a pausa no futebol brasileiro por conta da pandemia do novo coronavírus, a busca de alternativas para a retomada do esporte já fazia parte da maioria das discussões envolvendo o tema.
Em uma crise de saúde como esta, além dos esforços com o enfrentamento à doença e a preservação da vida em primeiro lugar, há também a inevitável preocupação com os prejuízos financeiros e econômicos que atingem os mais diversos setores da sociedade.
Faça parte do Footure Club e receba conteúdos exclusivos diariamente
No caso do futebol, que movimenta quantias bastante significativas de dinheiro e gera muitos empregos diretos e indiretos por todo o país, os desafios se intensificam, inclusive no âmbito jurídico.
A necessária parada das atividades dos clubes tendo em vista evitar a propagação em massa do vírus tem reflexos nas finanças, nas relações com funcionários, patrocinadores, fornecedores, torcedores e, sobretudo, no vínculo trabalhista existente com os atletas.
É importante nos lembrarmos de que, mesmo que sua relação de trabalho com o clube apresente diversas particularidades, como a jornada diferenciada e as cláusulas compensatória e indenizatória devidas em caso de rescisão antecipada, o jogador profissional de futebol é, em essência, um trabalhador como os demais.
OUÇA: Lei em Campo #13 | Os contratos na pandemia do Coronavírus
Isso significa que, embora a atividade desportiva profissional (aquela exercida por atleta profissional vinculado de maneira exclusiva a um clube, mediante a assinatura de contrato especial de trabalho desportivo que atenda aos requisitos legais) no país seja regulada especificamente pela Lei Pelé, diversas outras disposições aplicáveis aos trabalhadores em geral também podem e devem servir para a proteção dos direitos dos atletas.
Entre as mais importantes garantias ao trabalhador brasileiro está o direito à saúde no âmbito do trabalho, assegurado na Constituição Federal (art. 7, XXII) e com aplicação em diversas outras legislações. Este direito é a base das normas de higiene, segurança e redução de riscos ligadas ao ambiente de trabalho e ao exercício das profissões que conhecemos.
Em se tratando de atividades desportivas profissionais, se considerarmos que o corpo e a integridade física são as principais ferramentas de trabalho do jogador profissional de futebol, esta proteção recebe atenção ainda mais especial. Também por isso a lei determina que é dever dos clubes proporcionar aos atletas as condições necessárias para a sua participação nas competições, o que inclui a manutenção de um ambiente propício à preservação da saúde dos profissionais.
Neste mesmo sentido, diversas outras disposições legais e regulamentares têm como objetivo preservar a saúde e a plenitude física do atleta, como o intervalo obrigatório de no mínimo 66 horas entre a participação do jogador de futebol em uma partida e outra, por exemplo.
Ao enfrentarmos uma crise sanitária das dimensões da atual pandemia do novo coronavírus, o direito à saúde do trabalhador passa a ter ainda mais relevância.
Recentemente, o STF decidiu que a COVID-19 poderá ser considerada uma doença ocupacional se o empregador não puder comprovar a adoção de todas as medidas exigíveis para a proteção de seus empregados, gerando ao empregado todos os direitos correspondentes.
Em um primeiro momento, a Medida Provisória nº 927, editada pelo Governo Federal para permitir a flexibilização das relações de trabalho durante a atual pandemia, previa que esse reconhecimento somente poderia ocorrer caso fosse comprovado pelo trabalhador que a contaminação ocorreu no exercício de sua função.
Além disso, o já longo período sem atividades gera preocupação em relação ao condicionamento físico dos atletas e vira mais um elemento dessa equação que se busca resolver para enfim podermos ver o retorno do futebol.
Sendo o jogador profissional de futebol um trabalhador como os demais, lesões ocorridas durante suas atividades são consideradas acidente de trabalho e geram ao atleta os mesmos direitos.
Por isso, uma possível retomada mais ampla das atividades desportivas, com o retorno das equipes aos treinamentos e a redefinição do calendário de competições, exige a implementação de um rígido e consistente protocolo sanitário de ações que visem proteger a saúde dos trabalhadores e, consequentemente, toda a comunidade relacionada.
OUÇA: Lei em Campo #12 | Coronavírus no futebol: direito e desastre econômico
Momentos atípicos como o que estamos vivendo exigem medidas atípicas. Não há mais como esperarmos que as normas e ações anteriormente válidas e eficazes sejam ainda suficientes para estes novos desafios.
Além do imensurável prejuízo à vida e à saúde, ações que não levem em consideração a preservação de direitos básicos dos trabalhadores implicariam em novos e maiores reflexos financeiros e econômicos negativos em um momento já bastante frágil em todos estes aspectos.
Para que a bola possa voltar a rolar em segurança, atletas e demais profissionais do esporte precisam estar atentos aos seus direitos, assim como os clubes precisarão ter especial atenção em relação às consequências jurídicas das alternativas que se apresentam.
Comente!