Os meios justificam os fins do Real Madrid campeão europeu
14 Champions League não é para qualquer um. O rei da Europa está no trono novamente e o mata-mata foi destrinchado para a melhor compreensão do caminho feito até lá.
Considerar o contexto atual é entender o posicionamento do Real Madrid como equipe na final contra o Liverpool. Se você acompanhou toda a campanha do clube no mata-mata fica bem claro que o jogo performado na final não é nem um pouco surpreendente. Então vamos para uma premissa básica.
No mata-mata já era esperado que Ancelotti oferecesse a bola para os adversários. Independente da qualidade da equipe hoje, existem outras melhores, como vimos ao longo da competição. Com o lado individual a parte, Ancelotti priorizou, ao longo da temporada, os pontos fortes do grupo como um todo. E só assim o Real Madrid poderia sair campeão.
Algo recorrente é a necessidade de correr atrás do adversário em busca de recuperar a bola e, logo em seguida, sair rapidamente ao ataque, se livrar de marcações em transição e procurar os espaços para serem atacados até a linha do gol. Isso foi feito contra PSG, Chelsea e Manchester City. Não só contra o Liverpool. Agora vamos para uma essência do clube como instituição.
Ideias, filosofias e propósitos
O Real Madrid nunca teve em sua camisa algo relacionado a uma filosofia específica de jogo. O ideal é ganhar, não importa como seja. Em teoria, se você levanta troféus ninguém vai – ou pelo menos não deveria – ficar questionado como você chegou até ali. Você foi campeão e é isso que importa. No Real Madrid sempre foi assim. Esbanjar superioridade, sem obrigação de ter uma natureza exclusiva. O exclusivo aqui é ganhar e ganhar. (E o ‘aqui’ eu estou falando do ponto do texto, da circunstância dissertada, não do meu local como torcedora ou algo do tipo).
O objetivo de um jogo de futebol é bola na rede, o contorno são situações táticas que acompanham a chegada ao objetivo, e como cada um chega até ele é o que, normalmente, diferencia cada equipe. Debater sobre isso é extremamente interessante e válido, desde que não haja discursos baratos sobre verdades absolutas. Verdade absoluta não existe em lugar nenhum, no futebol muito menos.
Enfim. Contra o PSG foi observado um comportamento diferente do comum, mas completamente compreensível naquela conjuntura. Na La Liga temos uma distinção básica, aqui o Real Madrid é o clube com maior poder técnico e criativo disponível no elenco. Independente da escolha de jogo, quem resolve quem vai ficar com a bola não é nem o Real Madrid, mas sim os adversários, que preferem se resguardarem na defesa e atacarem no erro do melhor time – a menor chance de errar vista da ideia de jogo reativo. Vira questão de lógica básica em “melhor e pior”, e na Champions League não é diferente.
Ancelotti, escolhas e o jogo vertical associado ao jogo reativo e de transição rápida
A partir da competição europeia o grande ponto atual foi: Paris Saint-Germain, Chelsea e Manchester City são equipes melhores que o Real Madrid, ou seja, chegaram mais prontos (ou mais necessitados) do que o clube espanhol na fase final. Nesse contexto, o Real Madrid precisa jogar dentro do seu ponto forte, que é potencializar o coletivo com base nas características individuais de suas peças – o jogo vertical de Carletto é extremamente adaptável e facilita esse ajuste individual.
Nisso entra Fede Valverde, Eduardo Camavinga e Rodrygo, jogadores que podemos considerar titulares, mas que fazem rodizio para jogar, principalmente quando pensamos nos jogadores do meio-de-campo – Valverde é opção como volante e na ponta direita, Camavinga joga em todas no centro e Rodrygo joga em todas no ataque. Foi a partir desses jogadores que Ancelotti definiu seu estilo de jogo no mata-mata, ainda que outros sejam mais determinantes em suas funções – como o trio de volantes, Vinícius e Benzema, por exemplo.
Contra o PSG é nítido sua preocupação em levar o clean sheet para decidir no Bernabéu. Muito contestado, o treinador acertou em se defender o máximo possível, mas o grande ponto foi que não conseguiu em momento algum contra-atacar a equipe de Pochettino. O treinador argentino conseguiu potencializar suas melhores peças de ataque, principalmente Mbappé, e conteve as ligações entre os zagueiros e volantes com Benzema e Vinícius, tirando todas as chances de transição ao ataque madridista.
Na partida de volta fica mais óbvio como a decisão de “estacionar o ônibus” foi acertada. Ainda que Mbappé seja uma máquina de atacar o espaço, o Real Madrid também conseguiu explorar os espaços deixados pelos franceses. Sofrer nas transições defensivas em Madri era melhor do que oferecer isso em Paris e sair com o placar menos favorável para jogar a volta. Levar o confronto vivo para os 90 minutos finais era o ideal. Pronto. Já temos o primeiro exemplo claro em como Ancelotti escolheu jogar na Champions League na grande maioria das vezes – dar a bola para o adversário boa parte dos 180 minutos.
Contra o Chelsea tudo funciona – pelo menos no jogo da ida. O que não aconteceu em Paris, acontece em Londres. Aqui o Real Madrid consegue definir nas poucas chances que tem.
É o auge (em uma partida) do brilhantismo tático de Carlo na sua segunda passagem. Excelência defensiva, apesar do gol sofrido, e precisão no último terço – um pouco de sorte também no erro do goleiro Edouard Mendy.
Na partida de ida contra o Manchester City é mais difícil. O time de Pep Guardiola empurra qualquer adversário até a linha de fundo. É algo imensurável perto de qualquer outra no futebol mundial atualmente. Diferente de PSG e Chelsea, que intercalam a em determinados momentos, aqui o City domina completamente a posse de bola durante praticamente todo o jogo.
A dificuldade do Real Madrid em segurar a pressão gerada a partir da profundidade e bola cruzada era clara e óbvia. A qualidade coletiva era algo difícil de conter, e foi o que aconteceu. Era natural que o City empurrasse o Real Madrid para trás, ainda que Ancelotti escolhesse isso, a Terceira Lei de Newton se coloca como possibilidade neste confronto.
Razão e emoção
Assim como Pochettino em Madri com Danilo Pereira, Tuchel também levou alternativas para conter o ataque merengue com Loftus-Cheek em cima de Kroos e Mendy. Os adversários fizeram o mínimo e até mesmo mais do que o necessário, mas o mérito merengue é maior do que qualquer outra coisa – mas a torcida precisa agradecer ao Courtois bastante, inclusive.
O que definiu grande parte dos gols sofridos contra Chelsea e, principalmente, contra o City em Manchester, foi ter do outro lado um adversário extremamente dominante. O Real Madrid não era nenhuma fortaleza defensiva, e precisou superar seus próprios limites ao deixar a bola e esperar os avanços dos rivais. Isso é um fato. Mas, por outro lado, é o que resume as escolhas racionais.
E é agora que eu te pergunto. Por qual motivo contra o Liverpool isso seria diferente? Quem se espanta com o posicionamento do Real Madrid como equipe (e sem a bola) simplesmente não acompanhou ou se esqueceu de como o time se portou diante dos adversários passados. Contra o Liverpool ainda temos algo mais determinante ainda, Jurgen Klopp sabe atacar o erro do adversário como poucos. Ancelotti é mestre em usar o feitiço contra o feiticeiro e sabe como jogar contra o técnico alemão.
Em toda campanha de mata-mata, a superioridade do adversário para escolhas táticas e técnicas se sobressaiu na maioria do tempo. Por fim, temos a superação da inconsistência defensiva do sistema madridista para o ponto de desequilíbrio do ataque o fez sair classificado dos confrontos e vencer a grande final.
Tá bom… Eu sei. O Courtois tem MUITOS dedos nisso…
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